A BELA JUNIE
Christophe Honoré, La Belle Personne, França, 2008

A Bela Junie tem seu ponto de partida escondido numa observação curiosa e banal: o fato de que Jean-Pierre Léaud e Anna Karina, respectivamente ator e atriz mais representativos da nouvelle vague, jamais vingaram como par romântico. É sabido que o cinema de Christophe Honoré consiste simplesmente numa nostalgia fetichista e bobalhona de reatualizar o cinema francês jovem dos anos 60 que carregava seu espectador pelo charme dos atores, das atrizes, das situações (Truffaut, Démy, o primeiro Godard). Em seu mais recente filme, ele coloca uma moça de beleza excêntrica, Léa Seydoux, para interpretar uma jovem deprimida pela morte da mãe que, no essencial, só existe ali para fazer caras, bocas e pose de Anna Karina. Contracenando com ela, o (grande) ator apadrinhado por Jean-Pierre Léaud e símbolo hoje de tudo o que é cool no cinema francês, Louis Garrel. E, uma vez que Karina e Léaud não chegaram a ter seu momento ao sol, o relacionamento desses dois substitutos também será fadado ao fracasso. E o filme, idem.

O grande problema de Christophe Honoré é a cara de pau. Está aí um cineasta que tem uma sensibilidade de escrita, que consegue criar algumas dinâmicas interessantes (os irmãos ou a relação pai-filho de Em Paris) e tocar através de sua ficção alguma sensibilidade propriamente contemporânea (o intercâmbio de parceiros e preferências em Canções de Amor) – o que de forma alguma é banal –, mas, como com Spielberg, sua ânsia de agradar é tamanha que ele termina por jogar seus filmes no poço pelo excesso de zelo (no caso de Honoré o zelo chama-se fofura) que emana das saídas fáceis e do estabelecimento de um mínimo denominador comum, sempre a "doçura". Quem, além de Lars Von Trier, teria a pachorra de colocar seu personagem fazendo um interlúdio musical, cantando uma música melancólica, introspectiva, para reconduzi-lo em seguida à morte fria? (Ao menos em Dançando no Escuro pode-se aventar que a morte já era esperada).

Tudo em A Bela Junie existe pelo valor de face. A ficção propriamente dita é rala, as situações são requentadas e mesmo as situações pretensamente charmosas são no máximo blasé (o que não o impede de saber filmar sua atriz, mesmo em chave você-é-minha-Anna-Karina). Mas até aí, nenhum problema. François Ozon é um desses cineastas que sabe muito bem aproveitar o caráter direto e vagabundo do valor de face (apesar de esquecer de vez em quando, p.ex. Sob a Areia e O Tempo Que Resta). Mas uma coisa é a profundidade que Ozon extrai dos efeitos de superfície (Angel, 5X2, Gotas d'Água), outra é fingir que está no fundo do mar quando se está boiando. E Honoré, esperto demais, sincero de menos, ainda deverá penar alguns anos pra descobrir de que é feita sua sensibilidade.

Ruy Gardnier