A cada ano, nos é reconduzida
uma vanguarda que o aparelho crítico se apressa em
louvar, posto que ela vem do lugar de onde é presumido
que ela saia e que ela se comporta como uma “boa” vanguarda
deve fazer: dar ao espectador a impressão de participar
de um choque cultural sem desordenar. A partir de Arrabal,
Jodorowsky nos desempacota todos os estereótipos, todas
as formas congeladas características do dito gênero.
Cai-se em plena imaginária saint-sulpicienne1 revista
por um surrealismo para uso de liceus e colégios (do
tipo Vian para os sub-produtos literários). Precisaria,
aliás, retornar ao caráter reacionário do surrealismo
como reserva aparentemente inesgotável, mas, de fato,
totalmente esgotada, de estereótipos, e sobre o monopólio
da gestão da imaginária que visa instaurar. Produção
inteiramente econômica (em todos os sentidos do termo:
de meios e de miolos, mas que entretanto se relacionam), El
Topo desempenha apenas um déjà-vu [já visto]
e um déjà-su [já sabido]. O espectador é, bem
entendido, reconfortado em seu saber: “eu sabia, sem
bem que...”; “livre” a gostar ou não: o efeito vanguarda se
desempenha de todos os modos. Como toda tentativa de
representação
dos processos primários no cinema, esse filme guarda
do primário apenas este qualificativo ao propor “fantasmas” gastos
e secundarizados há muito tempo: castração, símbolo
fálico, todo o arsenal de psicanálise sem valor que,
confundindo simbólico e simbolismo, se maravilha com
a sua própria besteira (o que lhe promete sessões lotadas)
e descobre que o revólver é um símbolo (adivinhem!...)...
A simplicidade desses significados maiores deveria
fazer estourar de rir as salas, mas a coerção vanguardista
as impede e o filme é consumido quase religiosamente.
Uma lástima, pois talvez seja a única resposta possível
(rir) a essa presunção agressiva a qual o aparelho
crítico tenta camuflar a falta desesperadora de imaginação.
Jean-Paul Simon
(Publicado originalmente em Cahiers du Cinéma,
nº 264,
fevereiro 1976, pp. 64-65. Traduzido do francês
por Fabián Núñez.)
1.
Relativo à Companhia dos
padres de Saint-Sulpice; objetos de culto, quadros,
estátuas representando temas religiosos que se caracterizam
por um aspecto convencional e sem graça. O uso no texto é o
segundo sentido (N.T.).
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