SONHANDO ACORDADO
Michel Gondry, The Science of Sleep,
França/Itália, 2006

Gostando ou não gostando dos roteiros escritos por Charlie Kaufman – e eu certamente não me incluo na primeira opção – há que reconhecer que eles apresentam sua própria lógica e coerência. Foi certamente contagiado pela repercussão de Brilho Eterno de Uma mente Sem Lembranças que Michel Gondry resolveu seguir a linha de exploração de uma comédia romântica emoldurada nos limites da mente e da imaginação. Só que dessa vez, não existem as espertezas e reviravoltas do texto de Kaufman e, ao se arvorar como roteirista, Gondry parece ter criado a raiz para a maioria dos problemas vistos em Sonhando Acordado.

O "caos ordenado" sobre o qual Kaufman mantém absoluto controle, dá lugar a uma confusão que nunca deixa de sugerir uma distribuição de elementos absolutamente aleatória. Seja no roteiro, que parece uma colagem mal ajambrada de situações, seja na direção, que parece acreditar que a ausência de uma unidade rítmica e visual seria uma questão de estilo. Ledo engano, pois no caso de Gondry e seu Sonhando Acordado, tudo passa o clima de uma bagunça bastante tola.

Um presente nunca realista, sonhos e imaginação se fundem na história do sempre deslocado e avoado personagem vivido por Gael Garcia Bernal que ensaia um romance platônico com a vizinha Charlotte Gainsbourg. Porém as atribulações do relacionamento entre os personagens se refletem completamente no filme. Gael está completamente miscasted no personagem, e aquilo que deveria ser um sonhador acaba virando um patético débil-mental. Além disso, Gondry abusa de situações que deveriam ressaltar um aspecto simpático, ou por que não dizer "fofinho" do filme, mas que no fim das contas acabam se revelando pouco menos que patéticas.

A inserção constante de elementos advindos das mais variadas formas de cinema de animação, às quais Sonhando Acordado parece inequivocamente querer prestar uma homenagem, só vem ressaltar ainda mais a falta de unidade. Muitas vezes o filme transmite a sensação de estarmos assistindo a uma sessão – bastante ruim, por sinal – do festival Anima Mundi. E no fim das contas, o trabalho através do qual Michel Gondry supostamente pretendeu investigar de forma leve e bem-humorada imagens decalcadas no universo do sono e dos sonhos, acaba se revelando uma fórmula eficiente apenas para provocar os mesmos sono e sonhos na audiência.


Gilberto Silva Jr.