De acordo com a recepção geral
durante a cabine do Festival, parece não restarem dúvidas:
Madrigal é realmente um filme muito ruim. Atores
péssimos, diálogos constrangedores, elementos e viradas
de roteiro que simplesmente não fazem sentido algum,
uma trilha sonora de suspense que nunca encontra relação
com as imagens, frases de efeito que parecem tiradas
de almanaques infantis e enquadramentos ridículos que
ou apontam para um “cinema de arte” de terceira, com
seus plongés e travellings inusitados,
ou para um “cinema comercial”, também de terceira, que
não sabe como posicionar o rosto dos atores decentemente
em relação à câmera. Mas Madrigal não é apenas
um filme tosco, desses que provocam
risos involuntários, e, se fosse, esta crítica
acabaria aqui. Mais do que simplesmente um filme nulo,
Madrigal é profundamente insuportável.
Isso não seria algo difícil de supor, considerando que
esta é a nova ficção do diretor do também insuportável
Suíte Havana. E, talvez, na relação entre as
duas obras seja possível entender por que cada
minuto dos cento e dez que o filme tem passam
muito lentamente. Um sentimento enorme de auto-importância
perpassa Madrigal, como se cada frame fizesse
parte de um grande plano de entendimento do que são
as pessoas, os amores, a arte e o que mais conseguir
entrar em um filme. Não é necessariamente no didático
que Pérez investe (ainda que seu filme seja, sim, didático),
mas no profundamente significativo. Por isso, a cada
cena com um mínimo de suspense – e até em algumas que
não há suspense algum – é necessário um
som grave e alto de piano, marcando o ritmo e nos
avisando que aquilo, sim, tem importância. Por isso,
pequenas ações – uma simples mentira, um diálogo recorrente,
uma brincadeira de bastidores, uma revelação qualquer
– transformam-se sempre em problemas de vida ou morte,
carregando cada cena com um peso insustentável. Por
isso, o filme faz questão de frisar cada palavra de
seus atores, pois elas, aparentemente, detêm as respostas
para todos os dramas da humanidade. Por isso, as frases
de efeito, retomadas nos créditos finais, são acompanhadas
de um eco soturno. Por isso, e pior de tudo, Madrigal
precisa recontar a mesma história que acabamos de assistir,
agora de forma simbólica, depois de mais de uma hora
de projeção, em um mundo onde o sexo é obrigatório e
as pessoas vivem como escravos. E por isso o cineasta
se acha no direito de considerar que seu filme é o legítimo
final que René Clair não pôde filmar. Em Madrigal,
nada pode pesar menos que o chumbo, pois teria o risco
de passar em branco.
Em Suíte Havana, ao transformar a difícil vida
de alguns cubanos em uma “poesia visual” (dessas que
rimam amor com dor), Pérez parecia disposto a emocionar
a todo custo, com seus planos encenados, seus close-ups
dramáticos, sua música conduzindo a narrativa e, ao
mesmo tempo, servindo para resolver com facilidade todos
os problemas dela. Mas, se em Suíte Havana estas
operações pareciam falhas de caráter, Madrigal
leva a crer que o cineasta realmente acredita, com todo
o coração, naquilo que faz. E sua crença é tão forte
– e tão ingênua, ou mesmo até ridícula – que Madrigal
acaba caindo na vala dos filmes realmente insuportáveis.
Se não fosse por isso, Pérez seria apenas um péssimo
cineasta, como tantos outros, e a
crítica acabaria no primeiro parágrafo.
Leonardo Levis
|