TEMPORADA DE SECA
Mahamat-Saleh Haroun, Daratt, Chade/França/Bélgica/Áustria, 2006

Época de guerra civil, um avô estende a arma a seu neto e pede a execução da vingança. O homem que matou o homem do meio deve ser morto, respeitando a vendeta e prolongando o ciclo de violência. Primeiras imagens de Temporada de Seca, filme que dá continuidade à carreira de Mahamat-Saleh Haroun, diretor do muito interessante Abouna (2002), passado no Festival há alguns anos (o imdb.com informa que há no meio um documentário de 50min para tv de 2005, Kalala). O que produz um encanto logo de início é a frontalidade das imagens, um misto de precisão e simplicidade que, se nasce como produto de um savoir-faire não muito extenso, desempenha na economia de imagens do mundo contemporâneo uma diferença sensível. Temporada de Seca, filme notável? Não exatamente. Mas tampouco um filme a ser desprezado sem direito a um olhar mais atencioso.

Pois, como em Moolaadé do veterano Ousmane Sembene (mas não em Bamako, refinadíssimo), existe uma tal literalidade do relato visual que, apesar da aparente nudez de linguagem, seria redutor fazê-la confundir-se com procedimento naïf. Temporada de Seca se constrói em modo menor: gestos discretos de personagens, concisão da narrativa sem recurso à complicação da intriga, formando um todo harmônico e equilibrado. É verdade que é uma forma de construção já dominada, já conhecida, a duração de planos típica de um certo cinema de "arte e ensaio". Mas a frontalidade é pouco comum.

Temporada de Seca é a narrativa de O Filho – esse mesmo, o dos irmãos Dardenne – às avessas. Feito o caminho para a vingança, o jovem não consegue matar o assassino de seu pai. Pior que isso: não consegue olhá-lo no rosto. Falta-lhe a raiva, a motivação, o gatilho para que o assassinato não seja premeditado e a sangue frio, mas um ato de justiça contra alguém que faz o mal. O momento não vem, e o velho, um padeiro, acaba acolhendo o jovem como um filho, abrindo-lhe a casa e ensinando-lhe o ofício da família. A pergunta que faz o filme de Haroun é naturalmente sobre a vingança como círculo eterno da violência. Se no começo do filme o jovem é espancado por dois policiais, mais tarde ele espanca um oficial, se vinga. Plano seguinte, elipse, ele vê o policial, de muletas, sem uma perna: operação de justiça, justa reparação. Relato modelador, civilizatório, moralizante, sem dúvida.Com todos os limites artísticos que isso implica, mas também com duas ou três qualidades que vale ressaltar. Acima de tudo, um projeto que se coloca claramente como político e social, mas, sem recorrer a chantagens emocionais do drama costumeiro (musiquinha lacrimejante, identificação com os protagonista e com sua luta), Temporada de Seca mostra-se, peito aberto, como um cinema desfetichizado. Não é tudo, mas já é um começo.


Ruy Gardnier