O 13º
Guerreiro pode
ser visto indiscutivelmente como um filme-problema na
carreira de John McTiernan. Mais de dois anos separaram
as filmagens do lançamento comercial dessa adaptação
do romance Eaters of the Dead escrito por Michael
Crichton. Como o resultado da primeira montagem não
agradou nas exibições-teste, Crichton assumiu o controle
da produção, rodando material adicional e reeditando
o filme. Fica, portanto, difícil determinar aqui o quanto
permaneceu da concepção original de McTiernan. Mesmo
assim temos preservados momentos suficientes para fazer
constatar de forma intensa o domínio por parte do diretor
da arte da encenação cinematográfica, em especial no
que tange às seqüências de ação.
O protagonista-narrador,
vivido por Antonio Banderas, é um poeta árabe. Dessa
forma, a narrativa de O 13º Guerreiro tenta reproduzir
o formato de contos ancestrais, que se reproduziram
através dos séculos pela tradição oral e popular, como
as histórias das 1001 Noites ou o poema épico
anglo-saxão Beowulf, fonte primária de inspiração
pra o romance de Crichton. Assim, o filme passa a ser
regido completamente por essa lógica ao mesmo tempo
fabular e épica. Seus limites determinantes são os de
uma história que valoriza a primazia da imaginação,
que transcende eixos realistas nos planos temporal e
geográfico. Não estamos aqui no universo da verossimilhança,
mas das narrativas que primam pela imaginação.
Desse
choque entre a riqueza poética da cultura árabe e a
crueza e barbárie dos nórdicos europeus, surge o confronto
inicial de O 13º Guerreiro. Exilado em missão
diplomática entre os “homens do norte”, o personagem
de Banderas se vê levado a acompanhar esses guerreiros
na missão de resgatar uma comunidade ameaçada pelos
wendols, que dizimam suas vítimas cruelmente
decepando-lhes a cabeça, sendo vistos como monstros
sobrenaturais e vampirescos. Ponto de partida aparentemente
simplório, assim como simplória é a apresentação inicial
do contraste cultural entre o refinamento dos árabes
e o aparente primitivismo europeu. Mas é a partir do
momento em que a ação propriamente dita toma conta do
filme que O 13º Guerreiro passa a se definir
como uma peça cinematográfica vigorosa.
Como já
foi dito, não há como nos certificarmos do quanto isso
já estaria presente na montagem original de McTiernan
(com 20 minutos a mais que a apresentada), mas o filme
como é visto apresenta um ritmo narrativo quase sempre
coeso. É certo que pequenos saltos podem se fazer perceber,
mas em muito O 13º Guerreiro traz em si a simplicidade
e objetividade dos filmes de aventura do cinema clássico
americano. O combate aos wendols guarda em si
elementos arquetípicos que tanto poderiam se encaixar
na forma como os soldados de um forte se defenderiam
dos índios num western>dirigido por um Delmer
Daves, por exemplo, como estar contidos em um filme
de piratas de Michael Curtiz, ou até mesmo em peças
de terror de uma linhagem de filmes B. McTiernan traz
consigo uma herança clássica que consegue impor a todo
o momento.
Mais que
no conjunto, entretanto, é na apreciação de seqüências
isoladas que se faz notar a pujança da mise-en-scène
de McTiernan. Como aquela em que faz o filme decolar
de vez, onde, ao serem descobertos os restos mortais
de uma família dizimada pelos wendols, o vermelho
brilhante do sangue invade de forma igualmente violenta
a tela até então banhada por tons neutros e acastanhados.
Todas as cenas de combate constituem pequenas gemas
brilhantes, mas no fim das contas, O 13º Guerreiro
se justificaria apenas pela magnífica batalha noturna,
onde se vê um combate com tochas. Primor de composição
de imagem, luz e ritmo, nela McTiernan dá uma aula que
sintetiza toda sua maestria no artesanato da criação
de uma cena de ação. Pura e objetiva, independente de
sua beleza plástica, mas distante dos efeitos espetaculosos
dignos de um Michael Bay ou da pieguice cafona com a
qual Peter Jackson carregou seu O Senhor dos Anéis.
Terminada
a projeção, vemos que O 13º Guerreiro é um filme
no qual o espectador deve mergulhar com confiança e
fé. A mesma fé com a qual o poeta árabe se incumbe de
sua missão e que deverá, assim como ao personagem e
apesar de uma insegurança inicial, lhe proporcionar
momentos marcantes.
Gilberto Silva Jr.
(DVD: Buena Vista)
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