PARIS, TE AMO
Alexander Payne, Alfonso Cuáron, Bruno Podalydés, Christopher Doyle, Emmanuel Benbihy, Ethan e Joel Coen, Frédéric Auburtin, Gérard Depardieu, Gurinder Chada, Gus Van Sant, Isabel Coixet, Nobuhiro Suwa, Oliver Shmitz, Olivier Assayas, Richard LaGravenese, Sylvain Chomet, Tom Tykwer, Vincenzo Natali, Walter Salles e Daniela Thomas, Wes Craven, Paris, Je T’Aime, Alemanha/França, 2005


Em geral, filmes de episódios dirigidos por vários cineastas não conseguem alcançar um patamar de qualidade elevado. O motivo pode ser o mais diverso: a idéia funcionar como um caça-níquel para diretores consagrados trabalharem no piloto automático; o conceito, apesar de possivelmente interessante, não ter coesão, fazendo com que os episódios de qualidade acabem sendo apagados pelos menores; a escolha equivocada dos cineastas chamados para o projeto, entre outros. Paris, Te Amo, pelo contrário, sugeria algo mais. Não somente pela expectativa em relação ao novo trabalho de alguns dos realizadores mais relevantes atualmente – Gus Van Sant, Nobuhiro Suwa, Olivier Assayas –, pela participação no projeto de quem não é do ramo – Christopher Doyle, Gérard Depardieu –, pela possibilidade de descobrir, entre os 18 nomes, algum novo talento, mas, principalmente, por seu conceito originário. Dividir em 18 pequenos episódios a relação entre o amor e a cidade de Paris poderia funcionar como um filme absolutamente agradável, no qual a junção de crônicas acabaria por criar um painel carinhoso da cidade-luz. Infelizmente, em nenhum momento essa proposta alcança seus objetivos.

Mesmo que na introdução e na conclusão o “conceituador” do filme, Emmanuel Benbihy, tente reforçar a união entre cada filme e a alegria e emoção de se participar do projeto – seja colocando pedaços das obras em uma mesma tela, seja mostrando os atores abraçando uns aos outros entre as filmagens, ainda que os filmes a que pertencessem fossem diferentes –, e mesmo que ele tente reiterar esta sensação na transição dos episódios, não explicando qual é o último plano do anterior e o primeiro do posterior, temos, no final das contas, obras absolutamente distintas, sem relação alguma – estética, ideológica ou mesmo de narrativa – umas com as outras. Dessa forma, o julgamento de qualidade de Paris, Te Amo se dá em uma chave já menor do que a compilação se propunha: faz-se a média de cada curta e descobre-se a média que o longa merece. Essa média – já não muito animadora de se calcular, a princípio – revela-se bastante abaixo do que esperávamos.

Entre os realizadores pelos quais tanto ansiávamos os novos trabalhos, apenas Nobuhiro Suwa, em seu conto mágico de dor, tristeza e cowboys, alcança uma qualidade superlativa, nos fazendo caminhar por uma Paris noturna, desconhecida e delirante. O problema é que, se em 5 minutos o diretor já nos coloca em um clima novo, no minuto seguinte temos de nos separar dele, para o episódio posterior. Gus Van Sant e Olivier Assayas, se não chegam a decepcionar, também não parecem se esforçar para que seus episódios carreguem dentro de si tanto a cidade quanto o nível altíssimo de suas obras. Ainda assim, há cinema nos dois, sempre, e isso já basta para colocá-los bastante acima dos outros diretores. Christopher Doyle, em uma mistura mal-ajambrada de Wong Kar-Wai e Tsai Ming-Liang, não faz jus a seu talento de fotógrafo e proporciona um curta constrangedor, apenas amenizado pelo restante de Paris, Te Amo. Tom Tykwer faz o que se espera dele: coloca a câmera em fast-forward para que não nos preocupemos com o que filma. Wes Craven muda seu registro habitual – dos filmes de terror para um romance de casal – e prova que deveria permanecer no registro antigo, já que seu filme é uma bobagem que junta discussão de relacionamento, Oscar Wilde e, bem no fundo, o cemitério de Père-Lachaise. De resto quase absoluto, os curtas não merecem nem frases de uma linha. Diretores inexpressivos que deveriam permanecer sem expressão misturam fantasias estilizadas, dramas sociais, contos de amor, lições de moral, encenação, realidade e mímicos sempre da forma mais precária possível. Desse modo, aqueles episódios que simplesmente se mostram razoáveis (Bruno Podalydés, Irmãos Coen, Walter Salles e Daniela Thomas, por exemplo) acabam ganhando relevância dentro do todo. Quem perde é Paris...

Talvez uma boa síntese do filme seja a crônica que o fecha, de Alexander Payne. O diretor tenta resumir o amor de sua protagonista pela cidade, mas filma de forma a provocar apenas risos sobre a gordinha americana de péssimo francês. Paris, Te Amo é assim: uma falsa fábula de amor, destruída pela incapacidade de seus diretores de provocar qualquer diálogo mais profundo com o local que filmam, ou simplesmente de filmar algo razoável. Melhor ficarmos com o episódio dirigido por Gérard Depardieu e protagonizado por Gena Rowlands e Ben Gazzarra. Há, na simples conversa em plano/contraplano dentro de um café no Quartier Latin em que consiste o curta, todo o carinho, o amor e o espírito da cidade que deveria estar contido, também, ao longo das outras duas horas de projeção.


Leonardo Levis