MOTOQUEIRO FANTASMA
Mark Steven Johnson, Ghost Rider, EUA, 2007

Motoqueiro virtual

É difícil negar o sincero interesse e apreço de Mark Steven Johnson pelo universo dos quadrinhos, que vai além do fato de ter antes deste feito a adaptação de Demolidor, e de ser o mentor da futura adaptação de Preacher pela HBO. Se há algum tipo de qualidade em seus longas, é o fato de que, por mais toscos que possam parecer, há um olhar realmente interessado na construção daqueles universos por de trás do filme. Sua proposta de transpor estes universos para o cinema é interessante, pois visa encontrar em códigos do próprio cinema os caminhos, o que difere diretamente dos caminhos optados por Robert Rodriguez e Frank Miller em Sin City, onde realizam cinema mas sempre com um olhar de reconstrução de uma imagem. Mas Mark Steven Johnson não possui qualquer talento para o cinema, num sentido direto do termo. Mesmo Zack Snyder, em 300 (com métodos que se aproximam de Rodriguez e Miller), com todos os infinitos problemas que o filme possui, sabe lidar com o cinema, ainda que nem sempre se goste do cinema realizado por ele.

O caso de Mark Steven Johnson parece ser mais sério. É fácil confundir sua inaptidão com uma certa inocência por de trás do filme, mas seria fechar os olhos para o que a imagem evidencia. Os planos não se encontram, a estrutura dramatúrgica inexiste, os cortes vêm e vão a qualquer momento. Há ainda os incríveis momentos em que o filme num claro movimento de duvidar da capacidade de armazenar imagens na memória do espectador, explica da forma mais espalhafatosa o que e quem está em cena, sem qualquer respiro. E neste ambiente de total nada em termos de cinema, o que fica de algum valor para discussão é o uso das armas digitais que o filme realiza. Como numa versão radicalizada de outras versões para o cinema de heróis, o Motoqueiro Fantasma não é tocável, se quer parece existir em cena. Sua imagem é apenas uma digitalização, e isso é uma tendência interna do filme assustadora. Nada mais é tocável, nada mais é físico.

E não chega o caso de ser uma diferenciação de universos, o real de Johnny Blaze/Nicholas Cage e o de sua transformação. É verdade que neste submundo que cria Johnson tudo parece ainda mais virtual, vide toda a ambientação das cenas com o vilão, a voz toscamente alterada de Wes Bentley. O momento em que o coveiro se transforma num motoqueiro é um dos poucos que parecem dizer alguma coisa em termos de construção a partir do CGI, talvez por remeter demais ao quadrinhos. Mas é um lampejo raro. Se Johnson criasse a partir disto um universo do bizarro, do exagero, o tornaria interessante, só que a percepção disto exigiria dele um certo tipo de olhar e atenção para o que realiza que ele simplesmente não tem. E num filme onde nada parece realmente existir, onde até a luz que produz a sombra parece deslocada, não há marco maior do que a inacreditável seqüência em que Cage se vê no espelho e, embasbacado, vê o improvável: seu corpo totalmente alterado digitalmente.

Guilherme Martins