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Rogério Sganzerla não
foi o único cineasta homenageado pelo festival de Turim
de 2004. Além dele, de Luciano Emmer e do casal Gianikian/Ricci-Lucchi,
John Landis ganhou uma retrospectiva compreensiva de sua obra
inclusive com todos seus episódios para a série
"Dream On" e recebeu a atenção
geralmente atribuída a um autor. Ora, por que
John Landis, figura de proa dos anos 80 nas modas (filmes
de turma à O Clube dos Cafajestes), na revelação
ou na colocação em evidência de novos
artistas (John Belushi, Kevin Bacon, Dan Aykroyd), na criação
de alguns dos mais badalados filmes americanos do período
(Os Irmãos Cara-de-pau, Um Lobisomem Americano
em Londres), por que esse mesmo John Landis não
seria um autor, diretor que imprime uma marca personalíssima
em tudo aquilo que dirige, seja o projeto seu ou de outros,
seja o material de base fácil ou difícil de
manusear uma marca que não é só
um floreio "de arte", mas um estilo profundo e instigante
que, por baixo da aparente falta de assinatura dos filmes
de gênero, se insinua nos filmes e passa a povoá-los
como num ataque relâmpago? Em Landis, é uma guerra
civil que se resolve sem mortos e feridos. Em todos os filmes
em que foi bem-sucedido, ele conseguiu conjugar à perfeição
o manejo comercial de seus filmes com preocupações
muito particulares: entender o que é o cinema em comparação
com o mundo real, entender a força política
da pergunta "o que pode uma imagem?" para posteriormente
fazer uso dela, entender o papel que representa na linhagem
da comédia e do cinema fantástico americano.
Junto disso, uma outra preocupação, que se conecta
à edição anterior da revista (ficções
americanas) e junta-se com nosso tema principal na seção
DVD/VHS (Sidney Lumet): o poder que tem a ficção
americana de adequar-se a perfis de expectativa de público
(nada além do que chamamos de "gênero",
que, conforme Tag Gallagher nos ensina, não tem uma
existência real) e ainda assim talvez exatamente
por isso ter a imensa capacidade de questionar e dramatizar
em praça pública, com toda a luz dos holofotes
diante de si, os caminhos e descaminhos de sua sociedade.
Naturalmente, isso não é uma tendência
geral e disseminada do cinema americano (que país pode
se orgulhar de 100% ou ao menos da maioria de
sua produção anual?), mas é impressionante
como até filmes desprovidos de muito interesse conseguem
engajar costumes e valores de sociedade de uma forma que os
cinemas médios de outros países raramente conseguem
(estão aí os filmes islandeses, suecos, dinamarqueses,
espanhóis, australianos, ingleses para nos provar).
Ao mesmo tempo algoz por solapar economicamente quase
todos os cinemas nacionais de seus países, algo que
de forma alguma é questão aqui de minimizar
e fonte de vitalidade pois afinal, é
ainda e sempre ele o país produtor mais interessante
de filmes narrativos de longa-metragem, mainstream
(Menina de Ouro, O Aviador) ou alternativos
(Elefante, Encontros e Desencontros), "chiques"
(Kill Bill) ou deselegantes (Ligado em Você),
ou os dois ao mesmo tempo (The Brown Bunny). O veneno
e seu próprio antídoto esteticamente,
ao menos.
Em terreno nacional, é só agora que o ano parece
esquentar na verdade, começar. Cinco filmes
sendo lançados simultaneamente ou quase nos cinemas,
além de diversas estréias no festival É
Tudo Verdade, vêm restabelecer um quadro extenso de
preocupações, das mais fantasiosas (Jogo
Subterrânero, Bendito Fruto) às questionadoras
da sociedade (Quase Dois Irmãos, Cabra Cega),
passando pelo reavivamento do longevo gênero da comédia
carioca, dessa vez instalada do outro lado da ponte aérea
(O Casamento de Romeu e Julieta) e culminando na prolífica
produção recente de documentários de
longa e média-metragens. Razão de estímulo
e interesse para continuar a pensar essa cinematografia tão
particular e apaixonante quanto a nossa, mas ao mesmo tempo
atentos para que nenhum clima ufanista policialesco nos impeça
de fazer essa reflexão que é e sempre
será sobre cinema brasileiro porque é o único
que vivemos diariamente ao sairmos na rua, ao ligarmos a televisão,
nas reuniões, nos ônibus, nos bares e nas reuniões
nos bares partindo de outros países (principalmente
aquele que por sua plenipotência acaba nos determinando
e sobredeterminando, o americano) em que encontremos vigor
para seguir adiante. Reflexões, tanto sobre o cinema
brasileiro (em pautas sobre cineastas decisivos, ao longo
de nosso primeiro semestre, além da cobertura do festival
de documentários na próxima edição
e das críticas dos filmes na seção que
lhes cabe), quanto sobre o cinema americano (que persistirá
em forma de mesa-redonda na próxima edição),
quanto outras paragens igualmente importantes, tão
necessárias para uma reflexão universal do cinema
e da radiografia das imagens ao redor do planeta México,
Coréia, ontem, hoje, amanhã. É uma felicidade
dar a volta ao mundo e voltar para o seu próprio canto.
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