As relações entre BB e o B
Parte 2: prévia eleitoral


A revista Carta Capital publicou recentemente um cuidadoso estudo que buscava mostrar que a diferença de votos que elegeu o governo FHC nos seus dois mandatos tinha sua origem em dois espaços do território brasileiro muito específicos: a cidade de São Paulo e os minúsculos municípios brasileiros dos rincões. Nas cidades médias ou mesmo nas grandes, se viu às vezes equilíbrio, e até derrotas de FH. No entanto, simplesmente a diferença de votos conseguida na capital paulista e nos menores municípios asseguraria a sua vitória.

Podemos pensar então na penetração da Rede Globo e suas afiliadas pelo Brasil, e concluir que um pleito como o oferecido pelo BBB, com tamanha audiência e resposta de público (e não nos parece desimportante lembrar que o Ibope é aferido na Grande São Paulo), se assemelha em muitos pontos e conclusões possíveis de uma campanha eleitoral. Por isso mesmo, podemos arriscar inocentemente algumas analogias entre os candidatos de cada um deles, e como são vistos pelo público.

Comecemos então por André. Representante das minorias mais óbvias possíveis (negros e homossexuais, onde importa menos aliás que ele o seja do que a percepção do público que claramente assim o via), André era menos importante pelo apoio incondicional que recebia nos seus grupos de simpatia do que pela característica que marca as minorias: a rejeição. Importa menos que ele consiga a simpatia de 11% do Brasil do que o fato de que os 89% que não votam nele, jamais votariam. André, claramente, representou o papel de Lula na votação. É fato que o candidato petista já tem 3 eleições na costas e já foi líder de intenções várias vezes, mas o que decide seu destino continua sendo o mesmo fator: a rejeição. Os 11% de André podem até se tornar 30% com Lula, mas não importa: mais decisivo são os 70% que não o escolhem.

Vanessa, por ser mulher poderia nos fazer pensar em Roseana Sarney, e ainda mais por ser negra, em Benedita da Silva. Mas precisamos ultrapassar gênero e raça para entender o papel que desempenhou no pleito global: personagem neutra e sem carisma ou identificação especial, se não sofria de rejeição, também não possuía atrativos. É o nosso Ciro Gomes, aos olhos do grande público. Alguém que até passa uma imagem de respeito, mas que a maioria não sabe o que pensa, quem é. Os seus 22% podem ser relacionados diretamente com o choro pela saída de Serginho, e talvez fosse uma boa idéia Ciro Gomes convencer Patricia Pillar a abandoná-lo e ir chorar em público. Pensando bem, melhor não dar idéia.

E, finalmente, o vencedor: Bambam. Quem representa ele na corrida presidencial? Hoje em dia ele é muito mais uma "entidade" e uma corrente do que um nome. Bambam e Maria Eugênia são as figuras empáticas que conseguem tornar o eleitor um devoto sem questionamentos. É Jânio e a vassourinha, é Collor e seu gritos e corridas pelo parque. É a força do personagem acima da pessoa. Hoje só há um nome a quem compará-lo, mas que está fora da corrida, pelo menos por enquanto: Silvio Santos, que todos sabem, ganharia qualquer eleição a que resolvesse se candidatar.

Tão forte é esta figura, que bateu até o candidato do "sistema" e seu uso da máquina eleitoral. Quem viu o programa do domingo antes da final teve a sua disposição um dos mais descarados exemplos de edição tendenciosa da televisão moderna: de um lado o galante cavaleiro andante Serginho (representando a globalização e o charme do estrangeiro) contra o atraso tipicamente brasileiro de Bambam. A edição foi tão fantástica que conseguiu passar a diferença de oito para dois pontos, mas foi incapaz de suplantar o carisma de Kléber (e olha que até mesmo jogar as cenas com o choro por Maria Eugênia para depois do encerramento das ligações eles fizeram). E, não se pode negar, teve importante influência o fato de Sérgio não ser brasileiro. Ou seja, quem dera o brasileiro fosse tão nacionalista com o cinema ou com o seu próprio dinheiro como é com o dinheiro da Globo.

Aparentemente, a mensagem para a Rede Globo era direta: nem o poder da edição da realidade e do uso da máquina pode suplantar uma figura carismática e de forte identificação popular. Ou seja, Serra até se elege (como aconteceu duas vezes com FH), desde que não haja um candidato com o perfil populista certo. Garotinho e Roseana, de formas diferentes, até apelavam para este lado, mas não tiveram penetração nacional suficiente.

Mas, mensagem impressionante mesmo foi a que Globo mandou de volta, na terça. Consolidada a vitória de Bambam após a saída de Sérgio, a TV logo fez questão de abraçar o futuro ganhador, tratá-lo como o dileto filho querido (e não o neandertal de domingo). Ou seja, mais do que qualquer PFL, é a Globo que não sabe viver longe do poder (mesmo quando ela já o tem). Só existe um partido para ela, seja qual for: Situação. Vão-se os anéis e ficam os dedos. Mas sempre os dedos.

Há um BBB 2 prometido para maio. Mas, atenção, o importante mesmo só acontece em outubro. Mas, aparentemente, já começou a valer.

Eduardo Valente