S.W.A.T.,
de Clark Johnson
S.W.A.T.,
EUA, 2003
Pela duração da maioria dos
planos e pela função dos mesmos na narrativa, S.W.A.T
é resultado de uma operação na qual impera, de forma
negativa, a ditadura de uma nova convenção. Como a maioria
dos filmes americanos de grande visibilidade, percebe-se um empenho em
matar o sentido das cenas, seja por sua curtíssima duração,
seja por sua falta de propósito dentro do conjunto. Não
se dá tempo para detectar qual informação está
em quadro, tampouco se identifica a função de tantos enquadramentos,
menos ainda o valor dos planos por eles mesmos. A nova convenção,
portanto, seria contravenção – ao menos na relação
signo-significação. Seria se o objetivo não fosse
claro, como era nas vanguardas européias da alvorada cinematográfica,
quando, na busca de um específico da nova linguagem e de um cinema
"puro", pleiteava-se um encadeamento visual com dinâmica
visual. Não é o caso.
Como estamos em um exemplar que a indústria
vincula ao gênero "aventura", ou "ação",
os realizadores precisam dar à sucessão de cenas a sensação
de movimento permanente. Não havendo tanta ação física
assim para ser filmada e editada, pois também é preciso
incluir diálogos e articular falas e imagens para se contar uma
história, o movimento é obtido pela sucessão veloz
dos fragmentos. Não são os corpos e objetos que estão
a se mover com agilidade, a não ser em poucos momentos, mas o mundo
enquadrado pela câmera e construído pela montagem. Daí
tanta imagem sem outra meta a não ser estar ali entre uma anterior
e outra posterior para não significar nada e ao mesmo tempo instaurar
essa mobilidade. Busca-se uma relação de hipnose caleidoscópica
com o espectador para sequestrar sua atenção aos solavancos.
Hipnose como meio de transmitir algumas visões de sociedade americana,
de modo a manter o espectador em um acriticismo em relação
à essas visões.
Isso fica evidente nas passagens com funções
dramáticas e pedagógicas claras. Elas estão determinadas
a ensinar ao espectador qual é a opinião dos realizadores
sobre o mundo exibido, construído a partir do mundo exterior, e
qual a melhor forma de se lidar com os desajustes desses mundos (o da
tela, o de fora dela). Não nos importa a eficiência política
desse discurso de esclarecimento feito pelos autores, e moldado como espetáculo-aventura
de faxada escapista. Importa apenas como esses pontos de vistas são
expostos em evidências, traduzem a visão e as posturas de
um sistema, ou de parte dele, e dialogam com o momento no qual essas evidências
estão sendo geradas. S.W.A.T. poderia até ser avaliado
sob o prisma do sintoma de sua sociedade, como apenas um produto histórico
sem consciência dessa condição, se não fosse
na verdade fruto de uma interpretação dessa mesma sociedade,
um diagnóstico de doença acompanhado de bula para a cura.
Tal politização só não é encarada como
tal, ou raramente é, porque a forma serve ao sequestro da atenção,
não a uma conscientização pelo distanciamento sobre
o material.
A lógica dramática é
familiar: policial afastado de seu posto por desrespeitar a hierarquia,
em função da influência de uma má companhia
na S.W.A.T., tem a chance de se redimir e se provar necessário
para a comunidade quando uma nova equipe é montada. Seus colegas,
selecionados por um oficial experiente, têm o mesmo perfil: adoram
lidar com riscos e não têm medo de cometer abusos. O líder,
afinal, prega: "para fazer o certo às vezes é preciso
não fazer o certo". Apesar de estarem de uniforme, servindo
à uma ordem mediada por leis, os policiais têm regras próprias.
Sabem qual a melhor maneira de corrigir os erros da sociedade. Não
precisam de mediadores, mas da legitimação da grife S.W.A.T,
por meio da qual servirão ao coletivo. Um candidato respeitador
das leis, que não espanca bandidos e é vegetariano, não
passa na seleção. Seria obediente demais às convenções.
Estamos em um universo de pistoleiros viciados em adrenalina. No final,
diante de uma nova missão, com 20 horas de folgas vencidas, os
heróis sorriem. Têm à frente mais tirombaços
e vivem para isso.
O sistema punitivo é, portanto, louvado
à exaustão. E para se reverenciá-lo percebe-se o
esforço dos roteiristas em abraçar etnias diferentes como
forma de integrar todas as diferenças para erguer o conceito de
América. Negros e latinos lutam pela ordem: são americanos.
Mas outros negros e latinos promovem a desordem: são anti-americanos.
Para provar a necessidade de uma polícia linha dura, mostra-se
um recorte caótico da sociedade. Não se acredita na recolocação
do trem nos trilhos, pois lá ele nunca esteve, mas na necessidade
de se patrulhá-lo permanentemente, pois o trem está sempre
prestes a descarrilar. Daí a necessidade de se inseminar uma paranóia
em relação à segurança por meio de uma impressão
de realidade elaborada para se ressaltar a falta de controle nos EUA.
Os primeiros inimigos são os internos, os cupins roedores de pilastras.
Mas esses inimigos, como já se disse, são os anti-americanos
e, não casualmente, o vilão maior é um francês,
que, além de servir como resposta ao país europeu mais crítico
em relação à doutrinação Bush, investe
no único valor americano (aos seus olhos), o valor do dinheiro,
e escancara a amoralidade do país. A Swat seria, então,
a patrulha moral. Age por convição, não pelos dólares.
Quem dessa maneira se move, por grana, será punido com o extermínio.
S.W.A.T. é, dessa forma, um manifesto pela faxina social.
Quem não está com ela, está contra ela.
Cléber Eduardo
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