Quase
Nada,
de Sérgio Rezende
Quase Nada, Brasil, 2000
Mas que Nada
O ponto mais evidente notado sobre Quase
Nada é a motivação explícita já
no seu título, de um cinema simples, barato, despojado. É
uma intenção clara do filme, manifestada mais de uma vez
pelo diretor e pela produtora em entrevistas na imprensa.
Bem, então temos aí uma mudança
de discurso, um giro bastante grande diante das posições
tomadas até bem pouco tempo por Sérgio Resende e Mariza
Leão. Se até bem recentemente a disposição
de diretor e produtora tão prolíficos era de cada vez mais
enlaçar a relação entre profissionalismo e grandes
orçamentos, agora seu discurso percebe a existência da falta
de recursos, da renitente pobreza do país, e portanto da improbabilidade
de um sistema de megaproduções, sustentável a longo
prazo.
(Se o resultado final dos escândalos
das grandes produções inacabadas e da inaceitável
agressividade de parte da imprensa for este, o de fazer nossos respeitados
profissionais voltarem a um cinema mais simples e barato, ora, há
males que vêm para bem, reza o ditado...)
O filme? A economia caracteriza quase tudo.
Pode-se apontar um quase nada de escolhas que fogem deste pressuposto,
e talvez seja isso que denota certos ruídos do filme, cacoetes
de grandes produções, pessoas pobres bem vestidas demais,
até mesmo na cadeia.
Mas, no geral, a simpatia que desperta esta
simplicidade ajuda o filme a ter uma boa recepção. Seja
dos admiradores de Resende, que notam a facilidade que ele demonstra em
contar suas histórias, seja por seus detratores, que certamente
preferirão ver-se livres de sua grandiloqüência.
De novo, o filme? A primeira história
é muito boa, principalmente graças à interpretação
de Augusto Pompeo. A terceira é definitivamente problemática.
Fica a segunda a meio-termo, tendo boas interpretações,
mas uma história que, ao contrário da primeira, não
enlaça quem vê.
Os três episódios são
sobre paranóia e morte, a cada vez o demônio interno é
despertado de uma forma, e não por acaso a primeira história
é a que melhor se revela e resolve, uma vez que nela o inimigo
é palpável, é um personagem presente. Na segunda
o inimigo vem do passado, e só está presente na memória,
e o problema é justamente que o espectador não se comove
com o medo do que não existe. Na terceira o inimigo é o
ciúme e a dificuldade de amar do personagem, e neste caso a perda
maior não será a da própria vida, mas do objeto amado.
Talvez, entre todos os problemas óbvios do último episódio,
o mais grave seja justamente uma qualidade, que é da corajosa opção
em ter um protagonista antipático e desagradável.
A despeito de suas diferenças, os
episódios têm grande coerência narrativa e estética.
Ainda que acadêmicos, são um belo exercício de artesão.
Faço votos de que esse novo rumo seja mantido pelos produtores
do filme. Parece-me mais produtivo, para eles e para o modelo de produção
do cinema brasileiro.
Daniel Caetano
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