Piratas do Caribe: a maldição do Pérola Negra,
de Gore Verbinski
Pirates
of the Caribbean – the curse of the black pearl,
EUA, 2003
Um
filme de Jerry Bruckheimer,
Piratas do Caribe se baseia
numa atração de parque temático e tira boa parte de sua atmosfera narrativa
desse artifício. Como numa atração de parque de diversões, o filme funciona
como uma frenética composição de clichês e elementos do imaginário universalizado
dos “piratas”. Assim como os filmes de “bang-bang”, os “filmes de pirata”
foram um dos grandes fenômenos do cinema norte-americano nas décadas de
sua expansão econômica e comercial, chegando mesmo a caracterizar um arsenal
de falas, clichês e personagens imortalizados no imaginário ocidental.
O que Piratas do Caribe faz,
e aí é essencial sua ligação com a idéia de instalação temática, é uma
jornada através desses clichês onde um dos atrativos principais é jogar
de forma consciente / irônica com os estereótipos desse universo de personagens
e histórias. Está tudo lá: uma ilha do tesouro, um pirata bom e um
mal, navios amaldiçoados, uma donzela em perigo, rum e esqueletos.
O principal trunfo do filme é ter bem claro que sua proposta não é “modernizar”
os filmes de piratas, não é lhe fazer uma “releitura”, mas funcionar como
uma reconstituição de clichês através de um certo arsenal de ações e tramas
já pré-dispostas. Nesse sentido, o jogo entre os personagens e atuações
de Geoffrey Rush e Johnny Depp
é essencial: o primeiro leva ao extremo o clichê do “pirata-da-cara-de-mal”,
amaldiçoado, sarcasticamente malvado e careteiro; o segundo repete seu
típico exercício de máscaras farsescas, encarnando
um personagem hiperbólico e inconstante de anti-herói que funciona justamente
como a ponte entre o público contemporâneo presente aos cinemas (mais
acostumado com o cinismo com que as histórias de aventura tem
sido narradas por hollywoodiano nas últimas
décadas) e a ingenuidade óbvia de um simples “causo de bucaneiros”
(o que nos faz pensar na personagem da “donzela” que dizia não mais acreditar
em histórias de pirata...).
No
final, quando o “jovem e bom” ferreiro admite também ter sangue “pirata”
nas veias e o nobre inglês valoriza a ação de um pirata “quando necessária”,
o filme celebra justamente seu movimento de retorno exploratório e estratégico
a um sub-gênero antes relegado ao lugar do antiquado,
do envelhecido. Esse “assalto ao gênero”, proposto por Bruckheimer,
é o eixo-motor de todo o projeto e o motivo de seu êxito narrativo no
cultivo de um cinema preocupado antes em se afirmar como imitação da vida
(e atração circense) do que como discurso moral ou ético. Se esse primeiro
filme com a “marca” Piratas do Caribe tinha o interesse de
re-estabelecer um universo, um linguajar e um território de imagens sobre
o qual possa se multiplicar em muitas sequências,
o trabalho do funcional Verbinski e a estratégia
de produção de Jerry Bruckheimer, alcançam seu objetivo com perfeição.
Felipe
Bragança
|
|