Pão
e Rosas,
de Ken Loach
Bread And Roses, Inglaterra,
2000
O cinema de Ken Loach parece passar por uma
fase complicada desde sua "descoberta" internacional com Terra
e Liberdade, pois uma vez que se descobriu quais os componentes formadores
de uma possível "função Ken Loach", não
se consegue retirar nada de novo ou surpreendente dos seus trabalhos.
É claro que para muitos deve ser louvada esta chamada "coerência",
mas o fato é que o artista deve tentar se reinventar constantemente
para seguir vivo de verdade. E não parece que será com Pão
e Rosas que Loach fará isso.
É verdade, tudo que as pessoas gostam
em seu cinema continua lá: os temas atuais confrontando a "esquerda"
e a "direita" (estes termos surrados, mas em cuja existência
o próprio diretor afirma continuar acreditando), o tratamento "urgente"
seja no estilo despojado seja na montagem nervosa, os personagens comuns
interpretados por caras menos conhecidas do público representando
a luta da "pessoa comum" contra as circunstâncias histórico-sociais,
os conflitos entre interesses pessoais e coletivos. Portanto, não
há mais com o que se surpreender, embora devamos sempre ressaltar
o grande talento dele como diretor e revelador de atores, e sua capacidade
quase única de transformar discussões políticas e
reuniões de sindicato em matéria fílmica de primeira.
Também não deve ser visto como "novidade" o fato
de ele filmar num país onde até então não
havia filmado (os EUA), pois se você substitui EUA por Nicarágua,
Espanha, Escócia ou Inglaterra, ou ainda a questão sindical
pela guerrilha, ou as organizações de esquerda na Guerra
Civil Espanhola, ou a criminalidade e assistência social, ou os
conflitos religiosos, não importa muito se o filme é Pão
e Rosas, A Canção de Carla, Terra e Liberdade, Meu Nome
é Joe, ou Agenda Secreta.
Os detratores de Loach, aliás, também
podem continuar se queixando das mesmas coisas de antes. De um retrato
maniqueísta das estruturas sociais, do uso das ferramentas de identificação
comuns ao cinema mais conservador (envolvimentos amorosos, trilha sonora
comovente, divisão clara entre bons e maus, etc), de uma oposição
entre bem estar coletivo e individual que não compreende a co-existência
de ambos, etc. Nenhum destes, é bom que eu diga, me comove de todo,
porque acho que Loach assume estes "defeitos" como parte de
seu discurso mesmo, argumentando que há de fato uma divisão
bem clara entre "eles" (os donos do poder, dos meios de produção,
sejam eles patrões, governantes ou gângsters) e "nós",
a pessoa "comum". E que ele está do lado destes e pronto,
e se é para errar, melhor errar por esta causa.
Mas não é isso que me incomoda,
de jeito nenhum. O problema está mesmo no fato de ele ter estagnado
seu cinema num certo formato, numa certa fórmula. Que, é
verdade, até nos apresenta sempre "informações"
novas sobre um determinado tema, num sentido quase jornalístico
(no caso deste filme, a luta sindical americana, em especial dos grupos
de imigrantes nos EUA), mas que como procura artística de um novo
caminho para dizer estas coisas, encontra-se absolutamente imóvel.
Talvez possa-se dizer que isto deveria ser de menor importância
do que as questões que ele levanta, mas não posso concordar
de todo, porque acaba refletido completamente nos resultados conseguidos
pelos filmes com a platéia, cada vez mais "blasé",
mais passiva, pronta para ver mais do mesmo, como quem assiste mais uma
denúncia no Jornal Nacional. É o momento de Loach buscar
formas novas de voltar a mobilizar de fato a atenção de
todos.
Eduardo Valente
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