O Estranho,
de Steven Soderbergh


The Limey, EUA, 1999

Começo a entender o motivo que faz Soderbergh ser considerado um deus lá na sua terra. Ele é o maior representante de um cinema que tem como meta única abocanhar mercado. Soderbergh faz isso como ninguém, como um gênio. Consegue inserir todos os elementos que emprestam ao filme uma cara moderna, trabalhada, esteticamente estudada, lembrando um exercício formal aprofundado e engajado em algum movimento revolucionário para a linguagem cinematográfica. Cortes ousados, fotografia diferente, inserções de planos que se dizem expressivos apenas por lá estarem. Tudo isso engana. E o cinema norte americano está bastante enganado, assim como o seu público, há muito tempo.

Para platéias que acham fabuloso o uso pasteurizado de fórmulas pretensamente revolucionárias de narrativa cinematográfica Soderbergh é o tal Deus. É fácil embarcar no seu projeto de cinema modernoso e cheio de arroubos formais. É mais fácil ainda no caso do filme ser O Estranho.

Ao contrário de Traffic, esse filme anterior ainda possui como atrativo para estetas exigentes a vantagem de se colocar como cinema de produção mais baratinha. Podendo até ser entendido como um grito de revolta contra o padrão economicamente opressivo da maldita Hollywood. Sua história é de vingança, de determinação pessoal, com final de reviravolta. Nada mais adequado para forjar intenções underground despretensiosas do que fazer uso maquiado das mesmas fórmulas criticadas. Dizem que é apenas questão de (des)contextualização.

Enfim, posso perder muito tempo tentando criticar O Estranho. Mas posso também, inspirado no filme, dar uma de despretensioso e deixá-lo seguir sua carreira sem me preocupar demais com o que o mundo ou mesmo o que eu vou pensar a seu respeito. E, pensando bem, as salas de cinema estão cheias de outros filmes igualmente inócuos, à espera de uma análise crítica. Nada justifica me deter demais nesse Soderbergh.

João Mors Cabral