O Conde de Monte Cristo,
de Kevin Reynolds

The count of Monte Cristo, EUA, 2002


Kevin Reynolds certamente possui uma reputação muito mais de um diretor de aluguel do que de um cineasta com projeto estético ou ideológico. Se isso de forma alguma está incorreto, por outro lado esconde o fato de que seus filmes possuem pelo menos uma coisa incomum: um cuidado com a criação de universos audiovisuais que façam aflorar por si mesmos o fascínio mágico do ato de ver filmes como sonhos projetados. Não que se possa chamar seu cinema de onírico, mas se olhamos com mais atenção a projetos rejeitados por quase todos como o mal fadado Waterworld ou Rapa Nui (este sim um projeto pessoal do cineasta), vemos que não importa com qual grau de envolvimento, Reynolds consegue sempre nos transportar a um universo de encantamento que ultrapassa seus personagens e tramas. Não é diferente com este Conde de Monte Cristo, filmado com extremo talento pelo diretor, que consegue tornar atraente o espetáculo dos sentidos proposto.

Talvez a vantagem que este filme tenha sobre seus antecessores é que o estofo audiovisual de Reynolds foi levado à vida por personagens de um clássico da literatura como este de Alexandre Dumas. Folhetinesca por excelência, a trama permite ao seus vilões serem maus como nunca, a sua mocinha ser angelical ao extremo e o seu herói passar pelas piores provações que se pode imaginar. É como se Dumas estivesse estabelecendo os limites a que a ficção poderia chegar daí por diante. Sabendo que estão lidando com personagens já tornados ícones, os atores parecem se libertar para a diversão total do "to play". Richard Harris em especial empresta momentos sutis belíssimos ao seu Abade, personagem que dá uma injeção de ânimo ao filme quando ele começava a ratear.

A vantagem final do filme é que Reynolds optou por filmá-lo "à antiga". Ou seja, seus duelos de espadas são clássicos, sua encenação é direta e elegante, sua forma narrativa não quer se sobrepujar à trama ou aos personagens. Numa época plena de releituras e "modernizações" (muitas das quais não fazendo o menor sentido), não deixa de ser um prazer culpado sentar e assistir a máquina de diversão funcionando perfeitamente. Em última instância, o que Reynolds faz é um autêntico filme de sessão da tarde, de matinês, que se possui alguma auto-crítica e ironia, estas vêm da empostação de atores (como Guy Pearce, principalmente) e do uso de alguns clichês sem, contudo, sentir a necessidade adolescente de renegá-los por pura teimosia. Um filme absolutamente adequado aos seus intentos, realizado por um artesão talentoso no que se propõe.

Eduardo Valente