Matrix Revolutions,
de Larry e Andy Wachowsky


Matrix Revolutions, EUA, 2003

Como tanto se noticiou, sabemos que as duas continuações de Matrix foram rodadas ao mesmo tempo, o que não dei de ser curioso já que elas resultaram em filmes bastante diferentes. São ambos filmes marcados por uma série de problemas, mas Revolutions se sustenta melhor, talvez por ser mais honesto. É o primeiro filme da série que se assume primordialmente como filme de ação, além de ser também o primeiro que se passa quase totalmente fora da Matrix (o que resolve o problema de ter um herói tão poderoso que o interesse nas cenas de perigo se dissipava, algo que prejudicava muito Reloaded). Que a dupla de diretores não tente a todo momento mostrar que leu Baudrillard também é um ganho considerável.

Boa parte destes ganhos certamente serão vistos por muita gente como regressão da série, que teria virado um filme de ação comum. Bem, Matrix sempre foi um filme de ação comum a despeito do verniz que os diretores (e os publicitários da Warner) tentavam dar para o material. Ao assumir isso, os Wachowski conseguiram tirar mais do que é o grande achado da série: a construção de um universo particular com uma série de regras e mitos próprios. Neste sentido, mais do que a um videogame, o filme se associa ao RPG, e em alguns momentos mais inspirados os diretores são capazes de tirar deste universo particular algum interesse. Não deixa de ser curioso que este, que é o filme mais simples e direto da série, acabe sendo o que parece menos preocupado em agradar o espectador (apesar de os diretores manterem a mania de cortar para um personagem coadjuvante que assiste determinadas situações para que ele telegrafe a reação para o público).

Então porque Matrix Revolutions nunca decola? Ao meu ver o filme é derrubado por dois problemas que ele é incapaz de contornar. Para um filme de ação (e especificamente neste caso, um filme de ação que é visto pelo espectador com uma expectativa de marcar o gênero), ele é surpreendentemente incapaz de gerar interesse nas suas "seqüências de ação". Tem-se a impressão que os Wachowski se viram presos na camisa de força que a fama da série lhes deu. O tiroteio na casa noturna do Merovigian, por exemplo, chega a parecer uma auto-paródia. O maior problema destas seqüências parece ser o grau de envolvimento da pós-produção: ele é tão grande que gera sempre um afastamento por parte do espectador, cria uma barreira entre ele e o filme. A seqüência da batalha por Zion é especialmente infeliz neste sentido. Tirando alguns closes nos atores, ela se parece com um grande anime (que o espectador sabe que não é anime). São seqüências que carecem de alguma solidez que nos ajude a se interessar pelo que se passa ali na tela. Há muito barulho e muitos efeitos, mas para um filme que pretende nos manter tensos e excitados com o que se passa, a seqüência cai por terra porque nunca acreditamos que exista perigo algum ali.

O que nos leva ao outro problema do filme: Revolutions (e Reloaded) existem porque os Wachowski sentiam necessidade de continuar a história ou porque os fãs da série queriam mais? Nada contra continuações, existem diversos filmes que sustentam uma. Agora, há um problema sério em continuações que dão seqüência direta a ação anterior que não haviam sido propriamente planejadas desde o começo. Reloaded ainda disfarçava isso pela forma como complicava a situação; sem a possibilidade disso, Revolutions acaba revelando uma série de fragilidades na sua construção dramática que vai minando o envolvimento com o filme. Os personagens que podiam ter alguma força na primeira parte vão perdendo o interesse (com exceção do agente Smith), entre outros motivos porque nada que o filme mostra parece justificar muito nossa curiosidade em conhecer os rumos que eles tomaram, pós-parte um. O caso mais gritante é o de Morpheus, personagem que era bem importante no primeiro filme e que passa Revolutions todo sem função alguma: ele tem bastante tempo em cena para justificar a sua popularidade, mas ninguém envolvido com o filme parece capaz de descobrir o que fazer com ele; ele fica simplesmente ali. Sobra o tédio.

Filipe Furtado