O Trapalhão e a Luz Azul,
de Paulo Aragão




Brasil, 1999

Num festival de música onde vemos se apresentarem os Raimundos e o Rappa, um jovem sonha com a sua musa ao esperar a vez de se apresentar no palco da festa, que tem como mestre de cerimônias o DJ Cazé da MTV. Espera-se aí uma mudança de foco para os filmes de Renato Aragão, uma outra estrutura para seus filmes? Creia-se que não, e creia-se que nem isso é necessário. O essencial dos contos-de-fadas dos Trapalhões permanece o mesmo: um atrapalhado de bom coração ajuda a salvar um ecossistema de sua destruição ou de um aprisionamento e, ao mesmo tempo, contribui para reunir um casal "de sonhos", uma cândida princesa encontra-se com um cortês príncipe. E, claro, como sempre nos filmes de Renato Aragão (exceção feita a dois ou três), a intriga é sempre deixada de lado para dar vazão ao lado verdadeiramente interessante e pouquísimo utilizado nos últimos fimes que é a interpretação dos atores cômicos. Mas mesmo que O Trapalhão e a Luz Azul nada acrescente aos filmes dos Trapalhões e também não valha muito como peça individual, há sempre de considerá-lo como um evento cinematográfico, como sempre é um filme com Renato Aragão. Cada filme seu movimenta muito público e traz novas platéias e de classes diferentes ao cinema. O único momento realmente infeliz do filme é quando, depois de um discurso pontuado de críticas sociais (à origem nordestina, à falta de emprego, de habitação, por sinal pontuais no filme todo) e de uma decisão claramente contestatória, o êxodo, decide-se afinal por um discurso conciliatório, que ao menos toma o viés de uma cooperação/cooperativa entre os pobres quando o Didi encontra uma Adriana Esteves grávida e dormindo num banco de rua. Claro, o menino rico consegue se apresentar no festival, encontra uma musa igual à de sua terra dos sonhos, e nada impede que esse menino ricaço (roupas da moda, carro de luxo) seja amigo de um pobretão como o Didi, mas esperar o quê? Não há estritamente luta de classes em O Trapalhão e a Luz Azul e, em se tratando de uma fábula, nem se vê muito por que deveria haver. Só resta uma pulga atrás da orelha com o trono de direito, com a manutenção de um estado originário das coisas. Mas esse é dos males o menor e ao menos O Trapalhão e a Luz Azul existe.

Ruy Gardnier