Kate e Leopold,
de James Mangold

Kate and Leopold, EUA, 2001

Os filmes de amor são todos iguais, assim como as histórias de amor em si, diriam alguns. O que muda, sempre, é o talento do cineasta envolvido. E, mais do que isso, o quanto ele está disposto a se dedicar à sua história de amor. Como estas são sempre iguais, James Mangold resolveu fazer como boa parte do recente cinema americano e se diferenciar não por meio de um tratamento narrativo ou estético diferenciado, um carinho pelo personagem, ou uma verdadeira paixão pela sua história, que são sempre formas de escapar à estandatização. Resolveu ter uma "sacada", também chamada em inglês de "one-liner", ou seja, aquela idéia que se resume em uma linha. A dele foi: e se os amados em questão vivessem em séculos diferentes? (nada, aliás, de muito novo que já não se tenha visto, por exemplo, no clássico da Sessão da Tarde Em Algum Lugar do Passado)

Como todo "one-liner", o interesse de uma idéia como estas dura mais ou menos quinze minutos (motivo pelo qual o curta-metragem muitas vezes funciona como o paraíso do one-liner). Depois disso, é bom que algo mais aconteça na tela, seja em termos de emoção, seja em termos de desenvolvimento de personagens, história, ou forma de filmá-la. Pois bem, em Kate e Leopold nada mais acontece. Na verdade, o filme parece uma escola de samba que desfila o seu enredo sem qualquer crença na validade dele, na sua importância ou na sua novidade, sem paixão. Basicamente é um desfile da Imperatriz Leopoldinense (como diria Agamenon, "com trocadilhos por favor"), só que sem a beleza plástica e o ritmo do samba.

Mas pior que sua burocracia extrema é ver as chances que ele perde nesta falta de interesse. Por exemplo, toda a questão que envolve a viagem no tempo, ou mesmo a vida no século XIX (fonte do único efeito visual realmente fascinante no filme, que é a visão da Ponte do Brooklyn como se estivesse recém-construída) possui um acesso direto ao imaginário do espectador, aquele tipo de acesso que os melhores filmes americanos conseguem transformar na tal da "magia". Pois Mangold consegue tirar toda a magia de uma viagem no tempo, de um personagem deslocado na sua realidade, e se limita a contar a mais chinfrim das histórias de amor, fazendo aliás com que se apaixonar pareça tão burocrático quanto ir trabalhar todos os dias.

E, na melhor linha O Diário de Bridget Jones, comete o maior pecado do cinema "romântico" em geral: considerar que toda a vida de uma mulher consiste em esperar a chegada de seu príncipe encantado, que então dará sentido a ela. Não basta um homem que seja menos do que "impossível", assim como não pode haver satisfação em outros afazeres, como o trabalho (são mulheres que sempre devem se sentir completamente infelizes por serem "apenas" profissionais bem sucedidas, e que devam querer largar seus trabalhos para se tornarem o "amorzinho" de um autêntico gentleman). Em suma, Kate e Leopold é isso tudo e muito menos. E é uma pena que aceitemos que uma redução como essa possa ser chamada de um "filme de amor". Se o amor é isso, viva as mulheres-profissionais, como aliás ironizou com genialidade Altman em Dr. T e as Mulheres.

Eduardo Valente