Foi
Só um Beijo,
de Fisher Stevens
Just
a kiss, EUA, 2002
Recentemente exibido no Brasil, o filme italiano O Último Beijo
deveria ser obrigatoriamente passado junto com este filme de Stevens para
que ficasse bem claro por quais tantos motivos este trabalho americano
é tão ruim, ambos tratando mais ou menos da mesma situação-gênese.
Mas, entre os tantos defeitos que tem (e trataremos de alguns a seguir),
nenhum fica mais claro do que aquele que está implícito
no logotipo da empresa produtora que aparece antes do filme: "Paramount
Classics", numa certa estilização do logo da Paramount.
Afinal, o que teria este filme de um "classic"? Nada, de fato: a noção
de clássico apenas tem sido usada pelas majors para diferenciar
os filmes que não são seus produtos de massa para adolescentes.
Só que, talvez muito mais do que estes, estas marcas costumam apenas
significar uma produção extremamente "codificada", onde
o que importa é muito menos o conteúdo do que um certo "parecer
moderno". E parecer moderno é algo que este filme tenta desesperadamente
o tempo todo: da inútil estilização dos efeitos de
animação digital aos diálogos forçosamente
"hip", ao uso do digital e da câmera na mão no melhor look-Dogma,
tudo no filme é muito "mudernu". E completamente idiota.
Para começar,
o diretor não tem a menor noção de ritmo ou de encadeamento
dramático, o que torna o filme um doloroso exercício de
tédio (tédio que só parece menor que o dos personagens
em ação) para o espectador. Depois que, sob a desculpa de
usar um certo "humor surreal", o filme tenta esconder sua completa incapacidade
de lidar com seres humanos como personagens de fato (uma das características,
aliás, que tornava o filme italiano citado no início tão
"vivo"). Boa parte deste equívoco pode ser creditado à origem
teatral do roteiro do filme, que tem personagens que só podem funcionar
no registro farsesco do palco, e que aqui ficam completamente distantes
de qualquer empatia ou interesse.
Mas, principalmente,
o fato é que o filme opera sob as regras de um moralismo protestante
dos mais baratos e nocivos, e o que em O Último Beijo é
confusão e incerteza, em Foi Só um Beijo é
pura afetação e hipocrisia. Num certo momento, percebemos
que o filme se propõe um jogo que remete a O Fundo do Coração,
só que onde aquele era pura magia cinematográfica, este
é total cinismo de terceira. Onde os "estereótipos" desejáveis
de Nastassja Kinski e Raul Julia eram deliciosos e cheios de auto-ironia,
entram os cansativos modelos de Taye Diggs, Sarita Chadhoury e Marisa
Tomei (ressalte-se, aliás: um pitéu) que não inspiram
um suspiro de real desejo ou aspiração que seja, somente
o mesmo cansativo desinteresse de todo o resto do elenco. Quando, quase
no final, o filme propõe um enorme "rewind" à sua farsa,
o que vemos é uma boba e reacionária "coda" final.
O fato é que,
para além de todas as restrições argumentativas,
o que Foi Só um Beijo é, de fato, é uma chatíssima
egotrip de diretor, roteirista e atores, todos jogando o jogo do ser tão
"cool", quando são mesmo é "boring". Imagem não é
nada, sede é tudo. Não era assim que dizia a propaganda?
Fisher Stevens não tem sede de nada, que não de imagem.
Eduardo Valente
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