Janela da Alma,
de Walter Carvalho e João Jardim

Brasil, 2001


Típico filme painel de depoimentos, sobre tema vasto e pouco definido. Apostando na força poética e expressiva de seu objeto, na curiosidade de seus depoimentos e na habilidade fotográfica de Walter Carvalho, Janela da Alma se resume a uma sucessão de equívocos formais em busca de uma amplidão insustentável. A dupla de diretores parece acreditar de tal forma em seu Objeto (a visão e suas nuances) que se abstém de realizar um filme. O que se vê é uma seqüência de depoimentos sem rumo, mal costurados, dependentes demais do interesse que esse ou aquele personagem possa despertar. Com o vício documental da imparcialidade (comum a uma série de documentários de depoimentos, filhos bastardos da arte documental de Eduardo Coutinho), Jardim e Carvalho tentam realizar o impossível: um filme-ensaio sem tese! Um filme sobre a alma sem alma própria, um filme sobre a luz sem energia interna.

Recortar e colar, recortar e colar, esse parece ter sido o trabalho da dupla de diretores ao tentar peneirar das conversas aquilo que se encaixasse em seu tema de forma exótica (Hermeto Pascoal), curiosa (o vereador mineiro) ou intelectualmente embasada (José Saramago). É claro que é interessante ver gente como Saramago, Varda e Win Wenders falar sobre sua relação cotidiana com o olhar, mas o mais impressionante é como seus depoimentos são subaproveitados, picotados, desmembrados. Em função de um desejo estéril de acumular personagens, Janela da Alma torna-se apenas um canal (fraco) de transporte da voz e da imagem de um apinhado de gente, não sendo capaz de se tornar cinema. Menos interessante do que qualquer palestra sobre o assunto, ou qualquer ensaio escrito, Janela da Alma esqueceu-se de ser Filme.

Não consegue descobrir sequer um recorte dentro do tema. Falta aos diretores o talento documentarista de apontar (no universo amplo do objeto) aquela lâmina focal exata, aquele ponto de interseção criativo, em que se consegue falar de muito, observando pouco, mostrando aquilo que cabe em 90 minutos de projeção numa tela limitada. Janela da Alma acaba sendo o tipo de filme que poderia ter 90 minutos, 90 segundos ou 90 horas... Se a intenção era tentar construir um olhar amplo e não diretivo sobre o tema da visão, o resultado final é uma série de ligações do nada com a coisa nenhuma, costurada com pequenos malabarismos visuais de Walter Carvalho (essas sim, pequenas peças que parecem gritar ao espectador: "Vejam! Isso é cinema! Vocês não estão assistindo a um Globo Repórter!").

Incompreensível em suas intenções, acaba sendo um filme menor, muito menor, do que seus personagens reais.

Felipe Bragança