Uma
Lição de Amor,
de Jessie Nelson
I
am Sam, EUA, 2001
É só ler a sinopse do filme para correr um calafrio pela
espinha, que nos faz pensar em especiais feitos para a TV americana e
exibidos no nosso Supercine: um homem com deficiências, cuja idade
mental se assemelha a de uma criança de 7 anos, luta pelo direito
de educar sua própria filha sozinho. Não se precisa ir muito
longe, nem ser um expert em narrativa de cinema, para construir toda a
história do filme na cabeça, do início ao fim. E
não se errará por muito, como seria inevitável.
A diretora Nelson
parece plenamente consciente deste problema, tanto que tenta diferenciar
seu filme, formalmente falando, de um destes especiais de TV usando uma
inesperada câmera absolutamente nervosa, que trabalha quase o tempo
todo em closes e muito próxima dos atores. É verdade que
o artifício em alguns momentos empresta verdadeira urgência
a cenas e também mantém o espectador interessado. Mas, repetido
ao extremo, também soa vazio de sentido em muitos momentos. Mais
vazio e completamente arbitrário ainda é o uso das músicas
dos Beatles e suas histórias pessoais como um mantra do personagem
principal. Em nenhum momento esta idéia se une de fato com a narrativa
do filme, e parece tão somente mais uma tentativa de criar um evento
novo para enfrentar a previsibilidade do filme.
Dito isso tudo, não
se pode nem dizer que Uma Lição de Amor seja assim
tão ruim. Consegue fugir na sua maior parte dos excessos melodramáticos
e cenas apelativas, principalmente por construir o personagem principal
e seus amigos deficientes como um grupo eminentemente alegre e brincalhão.
Da mesma forma, leva a esquemática relação dele com
a advogada de forma passável, se não especialmente inteligente.
Mas, talvez sua principal habilidade e elogio seja a de nunca negar no
próprio filme algo que parece óbvio: a capacidade deste
homem de ser pai por sua conta é de fato altamente questionável.
O filme não deixa de apoiar no discurso a questão de que
"o que importa é o amor", mas na construção de várias
cenas parece piscar ao espectador dizendo que pode até ser o que
importa, mas que só ele dificilmente resolve tudo.
Neste sentido, a solução
final não deixa de ser coerente, e ao mesmo tempo até surpreendente.
Ao envolver a personagem da mãe adotiva da menina, retratando-a
não como o monstro que deseja tirá-la do pai e sim como
uma pessoa com compaixão, o filme consegue sua verdadeira diferença
do esquematismo mais exagerado, muito mais sutil e interessante que as
músicas dos Beatles e a câmera na mão.
Mas, e Sean Penn,
afinal? Sem dúvida ele consegue alguns momentos absolutamente emocionantes
e impressionantes, mas no geral parece simplesmente cumprir sua missão
de construir uma série de maneirismos vocais e faciais, e repeti-los
ao longo do filme. "Longo" sendo a palavra mais importante aqui, porque
o filme se arrasta por intermináveis 130 minutos num erro de mão
grave tendo em vista a tal previsibilidade da narrativa. No fim disso
tudo, o filme nem avilta nem realmente acrescenta muito. E fica a honesta
dúvida: precisava mesmo ser feito? Mas, aí, não convém
perguntar muito aos filmes em geral. Assistimos e esquecemos, assim a
banda toca.
Eduardo Valente
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