O
Assalto,
de David Mamet
Heist,
EUA, 2002
A qualquer cineasta que se proponha hoje trabalhar dentro do dito cinema
de gênero parece ficar a pergunta: "O que sobrou para fazer?"
O Assalto se filia a um dos gêneros mais desgastados e mais
fechados numa fórmula, o filme de assalto. Desde que passou para
o cinema no fim dos anos 80, David Mamet nunca se preocupou muito de fugir
do registro de gênero, mas antes deste O Assalto nunca havia
se imposto um argumento tão preso dentro das ditas regras de um
deles. O filme dá amplo espaço para as trapaças e
conflitos éticos que tanto interessam Mamet, portanto, não
se trata de um filme à primeira vista impessoal, desprovido de
possibilidade para desenvolver temas que interessem ao diretor. Se quase
tudo em O Assalto soa frouxo, isto me parece muito mais por conta
da resposta que Mamet encontrou para a pergunta que abre o texto.
O Assalto começa
com o antigo símbolo da Warner fotografado em preto e branco como
que a nos lembrar que este filme nos liga a toda uma tradição
de outros filmes B de assalto. Com alguns momentos dentro do filme já
podemos nos inteirar de todas as boas e más noticias. A boa, Mamet
com o tempo vem se tornando um diretor melhor, há algo de muito
agradável na forma como ele constrói cada plano, em como
ele leva seu filme tranquilo até seu destino de chegada administrando
as relações e conflitos como um anônimo diretor B
da Warner. Se este era o objetivo inicial do filme poderia-se no máximo
fazer objeções à falta de ambição de
Mamet, o espectador pode pensar. O problema é que, por mais que
queira, Mamet não é um diretor anônimo da divisão
B da Warner.
O seu pastiche de
filme de assalto acaba sendo só uma versão mais classicista
(e adulta) de todo este cinema auto-consciente pós-Tarantino. Mamet
constrói o filme todo (desde o título) de forma genérica.
Gene Hackman, por exemplo, não faz o ladrão Joe Moore, mas
um ladrão que por ventura se chama Joe Moore (até o nome
parece um anônimo José da Silva), alguém cuja única
consistência é representar uma série de tipos similares
que vieram antes dele. O cinema nunca se deu muito a estas generalizações.
O Assalto acaba ficando cada vez mais frágil à medida
que progride.
Nisto é bom
que se diga, não ajuda que até o roteiro de Mamet parece
mais cansado que o habitual, as reviravoltas são mecânicas,
mesmo os diálogos típicos do autor não têm
a inspiração de um Jogo de Emoções
ou Homicidio. A única energia do filme vem de alguns atores,
Hackman e Delroy Lindo, especialmente, fazem o que podem com os arquétipos
que receberam para interpretar. Eles têm uma bela cena no final
onde se reencontram após o clímax violento, é o velho
e surrado clichê dos bandidos honrados que respeitam um ao outro
-- ela é até mais velha do que as sucessões de traições
ou o velho bandido atrás do último golpe que norteiam a
trama --, mas por um momento O Assalto pareceu abandonar o terreno
do genérico. Pena que depois o filme retorne a sua rota normal,
a de ser um Guy Ritchie de luxo, a embalagem pode até ser mais
sedutora, mas o produto final é tão ordinário quanto.
Filipe Furtado
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