Hannibal,
de Ridley Scott


Hannibal, EUA, 2000

Dino de Laurentiis, Ridley Scott, David Mamet, Anthony Hopkins, Julianne Moore, Ray Liotta. Tanta gente boa, quantos filmes bons a gente não associa a esses nomes? Pois é, mas dinheiro é importante pra todo mundo. Será que é tão importante assim?

Hannibal é até um filme que mexe com a gente, deixa nervoso, bravos à eficiência da indústria.

Pena que é uma merda. E de péssimo caráter.

A produção é nota dez, Hopkins está realmente se divertindo naquele papel, e quem sabe dessa vez o de Laurentiis não consegue esquecer que não quis o roteiro do "silêncio dos inocentes"?

Mas não há ética, mister Mamet! Isso é apelação, é jogar com as formas mais baixas de seduzir o espectador. Que já acha estranho que a protagonista do filme tenha mudado de cara, enquanto o canibal continua o mesmo.

Mas pra quê o rosto mutilado do Gary Oldman? É pra fazer a piada de não botar o nome dele nos letreiros? Puxa vida, engraçadíssimo, hein? E porque o canibal não jantou ele? porque assim não tem filme? Ora, que razão nobre... bem, mesmo assim ele continua careteiro.

Não há personagens no filme, nada fica claro sobre o policial italiano, nem sobre o policial americano, só que um quer grana e o outro quer ser sacana. pra que explicar mais, se ninguém quer entender, a gente só quer ver o Hannibal exercitar nosso sadismo?

Baixo nível, baixo nível. A verossimilhança já foi deixada de lado por motivos mais nobres e por gente mais ética. Não precisava abrir a cabeça do Liotta e cortar o cérebro dele pra gente notar que tá valendo tudo pra divertir a turma que gosta de rir vendo gente sofrendo na tela. Vale tudo pelo seu ingresso, espectador...

Se abrissem o cérebro do diretor e dos roteiristas, pelo menos a ciência estudava o efeito da cobiça nos neurônios de uns e outros.

Outro dia, numa outra seção da revista, eu tava elogiando a cena final do Procissão dos Mortos, episódio de Luís Sérgio Person, parte do filme Trilogia do Terror, eu comentava especificamente a coragem em expor uma criança numa situação daquelas. Nada mais oposto que o final de Hannibal, igualmente utilizando uma criança, apenas para fazer a piada mais baixo nível de que eu tenho notícia. Bem, deve ter gente que acha engraçadíssimo ver uma criança querendo experimentar a carne descongelada do cérebro de um cara morto.

É Adam Smith: tem gente querendo ver, logo, teremos quem mostre.

Só não me peçam para gostar.

O mais lamentável é lembrar que o filme foi proibido para até dezesseis anos. É desagradável lembrar disso, até porque isso dá publicidade. Mas o filme de Carlos Gerbase, Tolerância, foi proibido pra dezoito anos só porque mostrou os peitos da Maitê Proença ou o bumbum da Maria Ribeiro. E Hannibal, que tem o Anthony Hopkins cortando o cérebro do Ray Liotta e fritando, e mais tarde mostra uma criança comendo isso, foi visto pelos nossos censores como algo menos grave, menos agressivo. Fascinante. Criança comendo cérebro humano é grave, só pode ver a partir dos dezesseis anos. Mas mostrar transas com a Maitê ou com a Maria Ribeiro é gravíssimo, aí só depois dos dezoito, né? Talvez nossos briosos censores sejam fãs do Hannibal. Ou então talvez tenham ficado revoltados com a má forma física do Roberto Bontempo, sei lá...

Daniel Caetano