Gladiador,
de Ridley Scott
Gladiator, EUA, 2000
Como sempre no cinema de
Ridley Scott, Gladiador nos oferece um universo do "belo",
nos oferece um mundo que nos seduz, no qual gostaríamos de ficar
um momentinho a mais. Trata-se, como toda mídia em volta do filme
faz questão de lembrar e relembrar, uma tentativa de retomada do
cinema épico, de bigas, gladiadores e imperadores. Uma tentativa
de ser para o épico o que Os Imperdoáveis foi para
o western. Mas aí onde Clint Eastwood conseguiu fazer muito
mais do que um simples western, Ridley Scott não conseguiu
fazer senão o lugar-comum do épico. Aí é que
reside toda a diferença do cinema de um para o de outro: ator antes
de diretor, Eastwood sabe priorizar uma certa problematicidade da cena,
da interpretação dos atores, e retirar daí nuanças
admiráveis. Nada disso em Gladiador: tudo nos é óbvio,
da foto "histórica" até a psicologia fraca e vagabunda
dos personagens.
Russell Crowe é o
grande general romano Maximus, que é desejado por Marco Aurélio
para ser seu sucessor, em detrimento de seu filho Commodus, covarde e
ganancioso ao extremo. As coisas se encadeiam de maneira lógica:
o filho comete parricídio e, invejoso, manda matar não só
o general como toda sua família. É claro que o general escapa;
quando ele vai à procura de sua família, percebe que todos
estão mortos e cai de desespero. Mais tarde, será vendido
como escravo-gladiador e só assim voltará a Roma para desmascarar
o imperador parricida. Pois é: trama muito comum, familiar como,
em geral, a tragédia grega, apoiando-se em pontos altos bastante
apelativos (assassinato do pai, família crucificada, luta pela
sobrevivência, etc.) e um herói à toda prova: nada
tão pernicioso assim, não fosse a risível "filosofia
do cinema" que percorre o filme.
De Matrix ao Show
de Truman, o cinema americano de hoje se faz de intelectual-soft para
brincar com a relação mundo-real/mundo-aparente, ou seja,
utilizar o cinema como metáfora privilegiada do espetáculo.
O mesmo em Gladiador: não faltam frases como "I'm an
entertainer" e analogias entre fazer cinema e jogar o povo aos leões.
O que incomoda é que, ao contrário de um Joohn Carpenter,
esse cinema nunca leva suas analogias às últimas conseqüências.
Prefere sempre contemporizar, dizendo que é a única opção.
Tanto pior.
Estranha e peculiar posição
em que o autor se coloca como entertainer, mas ao menos há
um reconhecimento e não se pode dizer que Ridley Scott não
é sincero. Pois seu cinema publicitário, mesmo quando bem-sucedido
(Blade Runner), não consegue fugir do jogo de estereótipos
tão comum da mídia dominante. Reconhecendo isso ele só
admite seu processo. Mas há sempre como alguém chegar e
dizer: não, eu não gosto de lutas de arena. E isso é
suficiente.
Ruy Gardnier
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