Vampiros do Deserto,
de J. S. Cardone

The forsaken, EUA, 2001


O início do filme parece um inventário do imaginário do cinema americano jovem. O sonho de trabalhar com cinema em Hollywood, um carro bonito e veloz, uma estrada no deserto, mulheres bonitas com seios de fora num carro que passa, muito rock na trilha. Certamente não parece propício a um filme de vampiro, mas esta é uma das tentativas do filme: primeiro de mostrar que este tipo de sonho, de ideal de vida comum, está a um fio de ser rompida a qualquer momento (quem diz isso textualmente é o próprio vampiro-chefe). Se pensamos nos acontecimentos pós-11 de setembro, é difícil não ver uma certa premonição nesta que tem sido uma imagem recorrente nos filmes americanos recentes. A segunda tentativa é justamente de "atualizar" o filme de vampiro. Por isso que eles se vestem como jovens modernosos, por isso que o rock pesado toca o tempo todo na trilha (o vampiro quatrocentão chega a cantarolar Metallica), por isso que temos cenas com uma edição videoclípica. Para se ter uma idéia, os vampiros participam seguidamente de trocas de tiros com os heróis da trama, ao invés de serem aquelas figuras de poderes sobrenaturais. Há ainda uma comparação constante da condição dos vampiros (afinal de contas, uma doença transmitida pelo sangue) com a AIDS, não apenas metafórica, mas praticamente textual.

Como a maioria destas tentativas de atualização, muitas vezes a superficial carga de "contemporaneidade" acaba sufocando alguns dos aspectos tradicionais mais interessantes sem chegar a oferecer nada em troca. Assim, boa parte dos duelos com os vampiros parece desinteressante. Também a tentativa de já ligar o filme com uma possível sequência acaba impedindo que se desenvolva a historiografia dos vampiros que um dos personagens menciona, e que poderia dar pano para manga. Por outro lado, é inegável que a mistura da "normalidade anormal" da paisagem desértica americana e seus habitantes com o misticismo dos vampiros, cria uma atmosfera bastante crível entre personagens e ambiente.

Ao final, fica a impressão de um filme que resvala em inúmeros pontos interessantes, mas que no geral foi solucionado em seus paradoxos com bastante preguiça da parte do roteirista-diretor. Como se ele indicasse que podia nos mostrar algo mais, mas no fundo não tenha a disposição de querer saber como. Uma pena.

Eduardo Valente