Evolução,
de Ivan Reitman
Evolution, EUA, 2001
Algumas críticas caíram em
cima do novo filme de Ivan Reitman por ele ser "bobo", pelo
roteiro não ser bem resolvido. Bom, é parte principal de
uma crítica ter a capacidade de se distanciar do objeto analisado
para perceber as intenções por trás do projeto. Por
isso mesmo, só consigo imaginar a extrema alegria de Reitman se
alguém chamasse seu filme de bobo, porque está claro que
ele passa quase duas horas se esforçando ao máximo para
sê-lo. Assim que, tal característica, se atingida, deveria
ser um elogio. E o fato é que ele atinge.
Num tempo em que o cinema americano comercial,
mas especialmente sua vertente mais claramente industrial, os chamados
"filmes de verão", são realizados tendo em mente
um público de 13 anos de idade, e na sua maioria diretores com
capacidade mental mais ou menos no mesmo estágio, este Evolução
só pode ser lido na mesma chave dos antigos filmes de Mel Brooks
ou ainda do trio ZAZ (Top Secret ou Apertem os Cintos... O Piloto
Sumiu). Ou seja, uma sátira aberta ao tipo de filme que se
tem realizado seriamente em exemplos como Armageddon, Independence
Day ou Godzilla. O único problema é que o filme
não assume tão claramente esta opção, não
usa citações de cenas ou piadas metalinguísticas
constantes como era comum nas comédias citadas acima. Por isso,
parece que nossos críticos não conseguiram perceber as intenções
de Reitman, e resolveram levar o filme a sério, e discutir a coerência
de seu roteiro. Pois se o mais incrível do filme é imaginar
o trabalho de Reitman e seus roteiristas em reproduzir a mente de um jovem
de 13 anos escrevendo um roteiro, num esforço hercúleo de
incorporação bem sucedida.
Vejamos: um roteiro onde absolutamente todos,
de policiais a cientistas e alunos universitários, agem como débeis
mentais o tempo todo, no qual toda situação construída
parece se relacionar com sexo através de uma fascinação
infantil (típica dos 13 anos). Um roteiro onde David Duchovny (o
agente Sculder, ou seria Mully, sei lá, de "Arquivo X")
diz num momento: "Nunca confie no governo", e depois como método
de investigação se pergunta: "O que eu faria se fosse
um alienígena tentando me esconder num shopping?" Um trabalho
no qual o espírito heróico militar americano, exaltado nos
filmes de verão, é anarquizado e ridicularizado. Um filme
cuja solução final se baseia numa série de conclusões
tiradas de uma camiseta com a tabela periódica, cuja substância
mágica é retirada de xampus, e cujo desenlace final revela
que a motivação do herói é uma, digamos, vingança
anal.
Pois bem, mesmo com estas nada discretas
pistas, a intenção de Reitman não foi percebida,
e pediram maior coerência na sua história. Mas se o filme
é justamente uma inteligentíssima brincadeira com a completa
falta de coerência, com a total infantilização e com
a pretensa seriedade científica de todos estes "blockbusters"!
Claro, ele não tem a "inteligência" crítica
de um Homens de Preto, mas isso porque não se propõe
a ser uma sátira usando a linguagem dos "adultos informados",
capazes de entender piadas metalinguísticas, e sim a mais autêntica
estupidez da produção média de ficção
científica americana atual. Se houvesse atenção de
fato a sutilezas de linguagem, perceberíamos que a própria
trilha sonora "over" é uma grande piada. Mas aí
já seria detalhismo demais.
O filme foi crucificado por público
e crítica, aqui e na matriz. Pena, porque o fato é que Reitman
tomou o risco de chegar tão perto do objeto satirizado que possa
ser confundido com um exemplar dele. Bom, pensando bem, nem chega tão
perto assim. Mas, para críticos e espectadores acostumados com
o nível de atenção requerido por aqueles filmes,
é difícil separar um do outro. Para os que gostem da tradição
auto-satírica do cinema americano, é um exemplar se não
clássico, que garante risadas em profusão. Bobo, incoerente,
preguiçoso, e muito engraçado.
Eduardo Valente
|
|