Star
Wars: Episódio 2 O Ataque dos Clones,
de George Lucas
Star Wars: Episode II - Attack
of the Clones, EUA, 2002
OK, então sai a segunda parte da segunda trilogia dedicada à
sagrada saga de George Lucas e dos jedis defensores da galáxia.
mas na configuração do atual cinema americano esse é
muito menos a continuação de A Ameaça Fantasma
do que a primeira das três trilogias blockbusters que prometem povoar
os mercados exibidores e os sonhos dos espectadores no mundo todo
o segundo Matrix já vem aí e o próximo Senhor
dos Anéis não tarda por esperar, isso para não
falar das seis continuações que o pequeno mágico
Harry Potter terá.
Mas "dois" também é
um número cabalístico para os fãs da série
Guerra nas Estrelas: foi o episódio da série inicial (O
Império Contra-Ataca, dirigido por Irvin Kershner) que mais
se sustentava pelos talentos de ritmo, direção e criatividade,
sem nada dever à mitologia um tanto assexuada e de ressonâncias
políticas um tanto complicadas da série (a fascinação
que o imaginário dos soldados do império cria já
desencadeou diversos debates). A notícia a dar para quem deseja
fazer o paralelismo é: sim, O Ataque dos Clones é
melhor do que Episódio 1, e não fica devendo tanta
coisa para O Império Contra-Ataca. George Lucas desistiu
de transformar sua primeira trilogia em uma fábula infanto-juvenil:
em comparação ao primeiro episódio, Episódio
2 é denso, político, o comic relief do filme
é mínimo e a trama não é das mais fáceis
de acompanhar (para quem não acompanha a série, então,
pode até ser confundido com um giallo à italiana...)
Eventualidades de mercado e intra-série
à parte, Episódio 2 O Ataque dos Clones é
um bom filme. Tudo aquilo que o cinema fantástico de grandes efeitos
especiais vem sistematicamente negando ao espectador nos blockbusters,
a saber, a criação de um universo, a transposição
para a tela de um mundo que existe apenas nos sonhos. Se alguns filmes
tentavam isso (Senhor dos Anéis, Episódio 1),
recaíam no mais ridículo antropomorfismo, na falta de imaginação
e, pior, na pieguice de um hiper-realismo da natureza. O Ataque dos
Clones não está livre disso: há ao menos uma
cena risível de tanto kitsch: o idílio amoroso de
Anakin Skywalker e da Senadora Amidala num lindo jardim natural delimitado
por uma infinidade de cachoeiras perfeitas. Mas se jamais estaremos livres
totalmente desse imaginário bastante made-to-order, há
lances de criatividade que compensam e ultrapassam de longe a banalidade
das partes mais prosaicas desse Episódio 2: no filme somos
levados, como numa montanha-russa, a visitar uma infinidade de terras
e ambiências, passando de uma supermetrópole onde até
o céu é engarrafado para o deserto absoluto, do máximo
de civilização e tecnologia para o convívio frugal
com a natureza.
Há um estranho embate que perpassa
toda a carreira de George Lucas, desde American Graffiti: devo
dar atenção aos climas que crio ou à história
que invento? Se o primeiro filme permitiu ver que Lucas era muito mais
bem-sucedido na primeira opção, não foi entretanto
o caminho que preferiu trilhar. Desde então, seu cinema vem sendo
como uma espécie de orquestra cujo regente tem que aliviar a tensão
dramática dos arranjos para melhor agradar ao solista todo-poderoso,
que ainda por cima nem é tão talentoso assim no tocar de
seu instrumento. Episódio 2, a esse respeito, não
acrescenta um novo capítulo a essa série, mas capta
um movimento da sinfonia em que o solista toma um ar (mesmo que dê
suas deslizadas: toda a intriga de Anakin como aluno primoroso mas afoito
de Obi-wan Kenobi é esquemática e redundante) e volta e
meia o regente se vê livre para dar suas golfadas veementes no ar
esperando que a orquestra, um tanto já escaldada, o acompanhe.
Há em O Ataque dos Clones, misturados, um filme selvagem
e esquizofrênico, outro melodramático e um tanto piegas.
Um filme de Tsui Hark misturado com um de Mel Gibson. Qual dos dois vencerá
no final? Na dúvida, nos deleitamos com o híbrido.
Ruy Gardnier
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