Cruz e Souza – O Poeta do Desterro,
de Sylvio Back


Cruz e Souza – O Poeta do Desterro, Brasil, 1999

Cruz e Souza vem, conscientemente ou não, na esteira de Bocage – O Triunfo do Amor. Afinal, são dois filmes "de arte e ensaio" sobre poetas, filmes que utilizam aquilo que entendem por "cinema de poesia". Há os que crêem esse cinema ser válido só por existir. Mas parece que esse cinema vem se estabilizando e se cristalizando como uma "categoria" dentro dos gêneros de cinema. Ora, nada mais avesso ao cinema de poesia do que essa cristalização. E se havia como criticar Bocage por uma certa escolha fácil demais de signos, em Cruz e Souza – O Poeta do Desterro isso tuso é alçado aos píncaros. A mãe é uma mulher nua de seios fartos (peito = leite materno), nos diz o começo do filme. A obviedade dos signos e toda essa "poesia" percorrem o filme todo, mas aquilo tudo que um filme sobre um poeta deveria transmitir – vida, no mais das contas –, Cruz e Souza não transmite. Quanto à função do artista no mundo, aquela mesma idéia romantizada do artista maldito, clichezada ao extremo. Aí cinema brasileiro e Hollywood são iguais, na puerilização da imagem, no uso desgastado do poder de evocação da imagem. Se em Yndio do Brasil Back até arriscava alguns versos, em Cruz e Souza ele dá um passo atrás: ao falar de poesia, daquilo que movimenta as palavras, faz um filme de antipoesia, que utiliza imagens assentadas no imaginário desde sempre.

Ruy Gardnier