Cine
Majestic,
de Frank Darabont
The
Majestic, EUA, 2001
Com Cine Majestic, Frank Darabont parece estar se propondo a uma
investigação sobre a identidade nacional americana reencontrada
numa cidadezinha esquecida de uma década de 50 que parece toda
composta a partir de outros filmes. Nada contra isto, se a mentalidade
de Darabont não fosse tão limitada ao ponto de não
permitir o mínimo de ambigüidade que um esforço destes
exige, e se o filme que ele fez não fosse tão cínico
e desonesto na forma que apresenta seu discurso ao espectador.
O filme parte da história
de um roterista (Jim Carrey) acusado de ser comunista (ele é apolítico
já que, segundo um certo cinema chapa branca americano, os verdadeiros
prejudicados da caça às bruxas nunca eram comunistas) que
bate o carro e vai parar sem memória numa cidade ainda de luto
pelos seus mortos de guerra. Lá é confundido com o filho
do dono do cinema local (Martin Landau), um jovem de conduta aparentemente
perfeita que foi dado como desaparecido em ação na guerra.
Só que existe algo de muito podre por trás do filme que
já soaria cínico caso fosse contemporâneo de A
Felicidade não se Compra (o último filme que o cinema
local exibiu antes de fechar as portas).
Porque existe uma
diferença muito grande entre o que o filme parece se propor a dizer
e o que realmente diz. No obrigatório discurso que Carrey faz diante
dos congressistas e da imprensa (com transmissão pela tevê
para o pais inteiro) no clímax, ele invoca a grandeza da constituição
americana e o direito que ela dá a todos de crer no que quiserem.
Só que na cidade de Lawson e no mundo idealizado e perfeito de
Darabont não há espaço para comunistas, aliás
não há espaço para nenhum pensamento minimamente
diferente (e Darabont trata de colocar um veterano de guerra ressentido
que é redimido (!?) por Carrey). O único personagem comunista
que o filme cita (mas não tem a dignidade de dar um rosto) é
um delator, ou seja a liberdade de pensamento é muito bonita na
teoria mas é bom que fique só lá, nada muito diferente
dos congressistas que Darabont finge criticar.
Até mesmo em
1951 (ano em que a ação se passa) o cinema americano já
enxergava que a existência perfeita imaginada por Cine Majestic
era falsa, como todo o noir ou as comédias de Preston Sturges
e Billy Wilder apontam. O filme ganharia bastante se um mínimo
de ironia fosse usado no seu retrato de Lawson, mas este é o tipo
de coisa que não podemos esperar de um mão pesada como Frank
Darabont. O diretor faz filmes que partem de subgêneros populares
(filmes de prisão, Frank Capra) e os infla com uma atmosfera de
seriedade opressora, buscando um tom literário através de
uma narrativa bem lenta e partindo de uma direção tão
acadêmica e estudada que acaba engessando o filme a tal ponto que
nunca há espaço para qualquer autenticidade ou para ao menos
um plano que cause surpresa. O resultado é que Cine Majestic
já pareceria um elefante branco perdido no tempo mesmo que seu
discurso não fosse tão reacionário.
Filipe Furtado
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