Cidade-Fantasma,
de Matt Dillon

City of ghosts, EUA, 2002


Poucos filmes concentram tanta informação em tão poucos minutos quanto Cidade-Fantasma no seu início. Em questão de instantes nós vemos um furacão destruir uma cidade do sul americano (e por momentos pensamos que o filme será sobre esta "cidade-fantasma"), em seguida descobrimos que a questão é que o seguro que protegia as casas destruídas era fraudado, logo depois descobrimos que o personagem de Matt Dillon está envolvido com esta fraude mas que o principal artífice dela está fora do país, e antes que possamos ter pensado muito lá está Dillon rumo a Bangkok e, na sequência, Cambódia. Uau. Se por um lado tudo parece um pouco corrido, por outro não deixa de ser uma opção corajosa de um estreante em direção, que consegue, afinal, ser bem sucedido neste excesso de informações em tão pouco tempo.

Mas o mais interessante é justamente que daí por diante o filme passará um enorme tempo sendo bem pouco informativo, e extremamente "climático". São os melhores momentos deste filme, disparado. À chegada de Dillon no Cambódia se segue uma série de sequências que parecem agregar bem pouco em termos de trama, mas que apresentam uma série de personagens absolutamente fascinantes na sua estranheza (talvez o melhor dele seja o interpretado por Gerard Depardieu, e certamente o pior é o interesse romântico de Dillon) e que, acima de tudo, tentam passar a idéia da perda gradual de controle do personagem sobre a trama que pensa dominar. É um homem de ação, sem dúvida, mas fica a impressão de que suas ações se tornam cada vez mais descontroladas enquanto ele penetra nesse universo cujas regras desconhece. Alguns comparam estas cenas com as de Apocalypse Now, talvez pelo fato de se passarem no mesmo lugar, mas me parece mais adequado pensar-se nos filmes de David Lynch (não é por acaso que o roteiro é dividido por Dillon entre com Barry Gifford, roteirista de Estrada Perdida e autor do livro que deu origem a Coração Selvagem) e uma outra comparação que seria bem adequada é com o clima de Estorvo (embora em registro bem menos expressionista da perda de contato do protagonista com a realidade).

Só que o problema maior é que lentamente Dillon caminha com sua história de volta a uma racionalidade, onde todo o clima e toda a estranheza estão a serviço de uma certa lógica narrativa francamente óbvia, na qual os personagens se tornam menos estranhos do que clichês batidíssimos de filmes de "estrangeiro em terras estrangeiras". À medida que vai fechando sua trama, o filme vai ficando menos e menos interessante, até o desfecho completamente desanimador. Deixa a impressão final de um diretor com um olhar sensível para questões como composição de quadro e domínio do tempo dramático, mas que trabalha aqui muito mais como um liquidificador de influências que ainda não conseguiu encontrar um olhar pessoal, uma junção adequada de seu estilo e seu conteúdo. Dá vontade de ver onde mais Dillon pode ir como diretor, mas sempre considerando este muito mais uma carta inicial de intenções e possibilidades do que um trabalho realmente bem resolvido.

Eduardo Valente