Canguru Jack,
de David MacNally

Kangaroo Jack, EUA, 2003


Aonde se procure referências sobre este filme, um nome será muito mais citado do que o do diretor MacNally: o do produtor Jerry Bruckheimer. O homem por trás da carreira de cineastas como Michael Bay e Simon West, afinal, ficou famoso pela sua capacidade de dar vida ao maior número de projetos "sem vergonha" no cinema americano do fim do século passado (se pensamos em Armageddon, Con Air e Dias de Trovão conseguimos ter uma rápida idéia do que se quer dizer). Todos os textos encontráveis sobre este seu novo produto ressaltam este seu "toque de Midas", desancando este seu filme como um desavergonhado e estúpido produto. Mas, ora, ora, se olharmos para a carreira de Bruckheimer, me parece que temos que ficar mais preocupados com suas tentativas mais sérias (como Pearl Harbor e Falcão Negro em Perigo, por exemplo), francamente daninhas (como 60 Segundos e Top Gun) ou as simplesmente lamentáveis como o citado Con Air.

Este Canguru Jack não se enquadra em nenhuma dessas categorias por um simples motivo: tem plena consciência auto-irônica de tudo que não é. Esta consciência está encarnada, por exemplo, no personagem de Christopher Walken, que nada mais é do que um grande pastiche de sua imagem cinematográfica. É com os mesmos olhos do pastiche que temos que olhar para a dupla de atores principais em sua rotina, ou para a presença da monossilábica (e deliciosa) Estelle Warren, como a "gostosona de bom coração", ou ainda no antagonista que é um verdadeiro Russell Crowe-cover. De resto, não há como não ver a auto-ironia presente, por exemplo, na cena do encontro amoroso numa cachoeira, digna de uma lareira de Top Secret - Canguru Jack ri de sua própria bobeira o tempo inteiro, como a cena final e o happy ending completamente over podem deixar claro. E é disso que nós até conseguimos rir também.

O filme parece retomar (junto, aliás, com alguns outros produtos recentes como O Núcleo) uma saudável mentalidade do "filme B" americano, aquele que passava como matinê para assistir com muita pipoca e gritaria no cinema, desavergonhado de sua "estupidez". Preocupa muito mais a estupidez reinante nos pretensos produtos sérios do que a festa do pessoal B (atores, diretor, cenas de ação, etc) que este aqui representa. Com uma ressalva - os efeitos digitais do canguru de computação gráfica são realmente muito bons, e inclusive só observá-los já é bastante divertido.

Eduardo Valente