Corridas Clandestinas,
de Reggie Rock Bythewood

Biker Boyz, EUA, 2003


É necessária uma pequena pesquisa sobre o diretor Bythewood para que se entenda um pouquinho o porquê de Corridas Clandestinas parecer um produto tão estranhamente híbrido. Desde o início percebemos que o filme aspira ser muito mais do que apenas uma sequência de cenas de motocicletas andando muito rápido e mulheres em roupas escassas (a semelhança deixa claro, porém, que o filme tenta seguir a linha de interesse de platéia de um Velozes e Furiosos). Há, desde as primeiras cenas, um foco na questão do "ser negro". Aqui visto não só como público-alvo (o que hoje já é uma realidade nos EUA), nem como um valor de atração em si (como o dos tempos do "black is beautiful" nos anos 70), mas como discussão mesmo de seus papéis na sociedade atual, e suas origens. Digo que é preciso pesquisar porque fica muito mais fácil entender isto quando descobrimos que Bythewood é, por exemplo, o roteirista de Todos a Bordo (Get on the Bus), talvez o filme mais claramente discursivo de Spike Lee sobre as questões que os negros enfrentam na sociedade americana contemporânea. Bythewood também dirigiu um filme anterior (chamado Dancing in September), que pela descrição parece muito com o A Hora do Show (Bamboozled) nos temas que toca.

Isso tudo serve para entender algumas das motivações por trás de realizar este filme, mas por outro lado também cria um problema: Corridas Clandestinas (também nos informam pesquisas pela internet), foi um filme feito a toque de caixa, com elaboração e realização muito rápidas, certamente querendo aproveitar o momento em que seu protagonista (Derek Luke) estreava com Antwone Fisher, que Laurence Fishburne preparava-se para retornar como o Morpheus de Matrix, e quando ia sair a continuação de Velozes e Furiosos (curiosamente também dirigida por um cineasta de origens no cinema negro independente, como é John Singleton, de Boyz N' the Hood). O filme tem na sua forma final as cicatrizes deste processo, e é daí que se fala num tal "hibridismo". Entre as discussões e tons seriamente trágicos e edipianos que Bythewood tenta imprimir ao roteiro, e toda a estética e ritmo videoclípico pedida das cenas de pegas de moto e toda uma "coolness" na imagem do negro na grande mídia, com suas mulheres gostosas e gírias "da hora", o filme flutua num espaço indefinido, onde nunca chega a trabalhar a contendo nenhuma de suas intenções. Além do que ele certamente tem, em sua hora e 55 minutos, muito mais tempo de tela do que tem história para contar, o que dilui ainda mais qualquer resquício de força que possa ter. O resultado é um filme que, se certamente não pode ser considerado "bem sucedido", tem elementos bastante inesperados que o tornam, no mínimo, diferenciado. A se esperar os próximos passos de Bythewood, de preferência com mais calma e menos imediatismo.

Eduardo Valente