Baran,
de Majid Majidi
Baran,
Irã, 2001
Majid Majidi, realizador de Os Filhos do Paraíso e A
Cor do Paraíso, é sem dúvida o mais "hollywoodiano"
dos realizadores iranianos (não por acaso foi "encampado" pela
Miramax). Isso significa uma série de coisas: se por um lado ele
possui um verdadeiro domínio de linguagem (talvez seja o que filme
com mais desenvoltura no Irã), por outro seus filmes parecem trafegar
no limiar tênue entre poesia e manipulação descarada
do espectador. No primeiro filme (primeiro visto no Brasil, bem entendido)
ele conseguiu que a equação acabasse resultando mais favorável
a ele, já no segundo ele perdeu a aposta e o filme escapou ao seu
controle. Este seu terceiro filme exibido no Brasil trafega num meio termo.
Não chega a ser tão equivocado quanto A Cor mas também
não soluciona seus problemas como Os Filhos, que era o postulado
do cinema de Majidi (como podemos ver hoje), mas também era o que
melhor mesclava os impulsos do cineasta.
Uma das marcas interessantes
de Majidi é que ele utiliza o mesmo "ambiente" cinematográfico
que a maioria de seus conterrâneos, ou seja: suas tramas lidam sempre
com o universo dos menos favorecidos no Irão, e revelam uma geografia
com características bastante realistas. Mas, ao usar este ambiente,
Majidi insere nele, por exemplo, uma mise-en-scène absolutamente
limpa (que chega a incluir artifícios de linguagem como um longo
take numa grua) e um encadeamento dramático bem mais "esquemático",
geralmente devendo ao melodrama como fonte de inspiração.
Neste filme, o ambiente
é o dos refugiados afegãos no Irã, retratados no
seu local de trabalho (clandestino): as obras. Inesperadamente, é
neste ambiente que Majidi encenará uma rasgada história
de amor. Como principal atrativo na encenação desta história
temos o fato de ser uma história de amor nunca consumada, ou seja,
absoluta e radicalmente platônica, portanto um filme de amor sem
cenas de amor. Se este é o mais positivo ponto da história,
temos um outro que o problematiza: uma vez estabelecida a narrativa e
sua lógica, pouco de novo acontece no filme de Majidi, seja estética,
dramatúrgica ou narrativamente. Como Majidi opta pela encenação
límpida e absolutamente linear, quando no filme nada parece estar
acontecendo, não se trata de uma opção radical de
encenação (como em Kiarostami, por exemplo) e sim de um
equívoco, pois o espectador-alvo dele reage ao cinema de forma
diferente do espectador de Kiarostami. Não se pode rezar a dois
deuses, ou melhor, até se pode, mas geralmente os resultados são
contraditórios.
Assim, se o filme
possui um inicial interesse (tanto pela realidade que revela quanto pelo
formato inesperado da "love story"), ele vai se diluindo pela sua duração,
onde os efeitos vão se tornando mais e mais óbvios. No final,
Majidi (cuja marca registrada é o fechamento de seus filmes com
"imagens-síntese" de teor poético/picareta - claro que dependerá
do gosto do freguês) até acerta de novo, conseguindo desta
vez evitar um pouco o excesso francamente brega de A Cor. Mas já
é tarde e o espectador já se importa muito pouco (ou muito
menos do que se importava no início). Baran certamente não
chega a ser um mau filme. Mas é apenas mais um filme.
Eduardo Valente
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