Atrás
das Linhas Inimigas,
de John Moore
Behind
enemy lines, EUA, 2001
Atrás
das Linhas Inimigas vêm
sendo muito criticado pelo seu tom pró-militarista e americanismo
explícito. Sim, o filme se parece com um longo vídeo institucional
da marinha americana onde o único personagem estrangeiro tratado
de forma positiva é um jovem bósnio que ouve rap e bebe
coca-cola. O diretor John Moore e osa roteristas David Veloz, John Thomas
e Zek Penn parecem acreditar que se for preciso que algumas centenas de
bósnios morram para que se salve um soldado americano que assim
seja desde que "tragam o nosso garoto para casa".
Pois bem, o que Atrás
das Linhas Inimigas tem de melhor é justamente a forma como
assume abertamente este discurso, ao contrário de outros filmes
de guerra recentes (O Resgate do Soldado Ryan, Círculo de Fogo)
que no fundo continham idéias semelhantes, mas que procuravam disfarçar-las
sobre a fachada de serem filmes "sérios" e "antiguerra".
A própria existência hoje de um filme como Atrás
das Linhas Inimigas já tem muito interesse. Qual a última
vez que o cinema americano tinha produzido este tipo de aventura de guerra
que já fora muito popular, mas tinha desaparecido nos anos 90?
Só o fato de terem dado sinal verde para um filme como este já
mostra uma pré-disposição maior de parte da sociedade
que o produziu em aceitar o seu discurso. Em alguns momentos, Moore não
só verbaliza o desejo das forças armadas americanas em atuar
como "a policia do mundo", mas deixa passar um reconhecimento amargurado
de que esta assim o faz porque precisa manter seu ímpeto militarista
e justificar o seu maquinário.
Quem descarta o filme
como uma "bobagem patriótica" deixa escapar, ou não
tem interesse algum em procurar além do mais óbvio, aquilo
que realmente é ignóbil no filme. A forma como este bombardeia
o espectador de forma a negá-lo qualquer direito à reflexão.
Uma recusa total em simplesmente apresentar a situação e
deixar que o espectador decida por si mesmo. Não basta o exército
sérvio ser apresentado como responsável por genocídio,
é preciso filmá-lo sempre em câmera lenta e fotografia
escura de forma que o espectador não possa ver os sérvios
como menos que "a grande força do mal" (alguns planos
dos sérvios se locomovendo não ficariam deslocados em O
Senhor dos Anéis).
John Moore parece
incapaz de simplesmente filmar uma cena, a imagem por si só parece
nunca ser suficiente. É preciso enfeitá-la com todos os
adereços possíveis. Há uma cena onde em cerca de
um minuto vai-se de uma edição de videoclipe a câmera
lenta passando por bullett time e plano congelado e cada outro
truque que o diretor conseguiu incluir. A experiência de ver o filme
vai se tornando progressivamente nauseante tamanho o desrespeito pelo
cinema e o espectador. Nisto John Moore e a maioria dos seus críticos
parecem concordar: enquanto um consegue continuar mostrando que sabe "filmar
bem", o outro segue constatando o óbvio, e detalhes como a
inteligência do público e o cinema podem continuar esquecidos.
Filipe Furtado
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