A
Praia,
de Danny Boyle
The Beach, EUA, 1999
De Danny Boyle, vemos imediatamente
um certo tipo de temática: a incursão do jovem num universo
estranho outrora da ambição, da viagem junkie.
Dessa vez a estranheza é geográfica. É a entrada
de um jovem "safo" num mundo imaculado pela sociedade, uma espécie
de nova chance para a humanidade, uma sociedade alternativa funcionando
em uma paradisíaca praia de uma ilha da Tailândia. Bizarro?
Apenas no ponto de partida. Porque a realização, em si,
apresenta um sem-número de déjà-vus do novo
cinema "jovem" americano (o cinema cyber-publicitário
de Matrix e Clube da Luta). Isso fica mais claro quando
vemos a tal praia que dá nome ao filme. A água verdinha,
as montanhas que circundam, a areia branquinha transformam o cinema numa
espécie privilegiada de spot, de um exemplar do ideal estético
(estético para quem, cara pálida?) do imaginário
da propaganda: o hiperrealismo.
A história é
pouco convincente, infantil até (como, em geral, os filmes "de
praia"): um menininho quer fazer um progama "arrojado"
na Tailândia, ou seja, fugir do oba-oba dos turistas comuns e experimentar
"emoções reais", u-hu! Nessa onda toda, muita
contracultura, ou seja, maconha e música trance, sintomas "de
autor" de Danny Boyle. O menininho, aliás Leo DiCaprio, chama
o casal de vizinhos franceses no hotel para acompanhá-lo na procura
da ilha. Claro, sabemos de partida que a francesinha, aliás a delícia
Virginie Ledoyen, vai cair nos braços de Leo DiCaprio. Todos sabíamos,
afinal, que o trio chegaria à praia. E lá chegando, o que
vemos? Primeiramente, um momento em que tudo funciona bem, às mil
maravilhas, e essa vida em família/comunidade constitui a parte
mais agradável do filme, excetuando a ridícula cena do tubarão.
Mas, num momento, a vida daquelas pessoas começa a dar errado.
Dois membros da comunidade aparecem mutilados ao voltar da praia. Um morre,
o outro agoniza. Primeiramente, é bonito: todas aquelas divagações
sobre a felicidade e sobre o novo rearranjamento emocional do grupo. Mas,
claro, como em todo filme convencional, à partir da primeira infelicidade,
o filme toma o ponto de partida paranóico: tudo no grupo passa
a assumir a feição nojenta e asquerosa da morte. A felicidade
parece não maquiar mais as rachaduras no meio do conjunto: a francesinha
briga com Leo, e tudo termina num julgamento sumário e nas figuras
paranóicas dos "grandes déspotas": a líder
do grupo e o grande traficante local.
Claro, o fim do filme não
é trágico, nada realmente acontece, mas o grupo se dissolve
por si mesmo, como se em nenhum instante tivesse possibilidades de "dar
certo". Ao contrário de filmes como Os Idiotas e A
Chinesa, que mostram a força e os prolongamentos posteriores
da vida em grupo, A Praia mostra como a única lembrança
é uma fotografia mandada por e-mail, de um país distante.
OK, rapazes, está tudo bem. Foram apenas as férias do menino.
Sem mortes, sem amores, sem vida enfim, A Praia não é
narrativa de aprendizado, não é relato de uma experiência,
não é nem a história de um acontecimento. É
a redação intitulada "Minhas férias como menino
rebelde".
Ruy Gardnier
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