Viy – O Espírito do Mal,
de Giorgi Kropachyov, Konstantin Yershov
e Alexandr Ptuschko (não-creditado)

Vij, URSS, 1967


Viy – O Espírito do Mal (1967) é a terceira filmagem soviética do conto de Nicolai Gogol, inspirado em uma lenda ucraniana: o encontro de um seminarista (Khoma) com uma bruxa na floresta, que acaba resultando na morte desta, e a "missão" que ele recebe do pai de uma rica donzela, de ficar três noites "encomendando" sua alma... que acaba revelando ser a tal bruxa. Na terceira (e última) noite de rituais ela chama sua "turma" para levar Khoma junto com ela... Trata-se de um dos raros filmes russos de horror. Foi um imenso sucesso por lá, talvez por atender a uma demanda reprimida ao gênero, tendo ficado anos em circulação nas telas soviéticas (foi visto pelo crítico britânico Alan Upchurch em São Petesburgo em 1981, em uma visita deste ao país, fora de qualquer ciclo ou festival, em uma sessão totalmente lotada) a ponto de ter sido um dos primeiros filmes a serem lançados em DVD naquelas plagas. Foi exibido no Brasil ainda nos anos 60, sob o título A Lenda do Monstro Viy, mas não achou sua audiência: não foi descoberto pelos fãs de horror, que o acharam muito "suave" (já que a injustificável censura 18 anos o fazia competir com filmes bem mais violentos), e era pesado demais para os fãs de filmes "artísticos", que esperavam que todas as obras russas falassem só da foice e do martelo.

Por mais que esteja creditado aos formandos da turma de cinema Konstantin Yershov e Giorgi Kropachyov, o verdadeiro "autor" do filme é Alexandr Ptuschko (1900 - 1976), listado nos créditos como co-roteirista, supervisor artístico e diretor de efeitos especiais. O veterano (que não fazia efeitos especiais para os filmes dos outros desde os anos 40) foi consultado pelos diretores sobre como fazer alguns efeitos especiais para o filme de estréia de ambos. Chegou no set para dar palpites, acabou reescrevendo o roteiro, chamando seus colaboradores (como sua eterna assistente, Sarra Mokil) e dirigindo grande parte da obra (na base do "deixa eu mostrar pra vocês como se faz isso"). Como era o grande ídolo dos dois pretensos diretores, ficou tudo bem, eles acolheram todas as sugestões do velhinho e acharam a coisa mais normal do mundo ele ficar ensinando-os a filmar, fazendo-os aprender mais que em toda a recém-concluída Faculdade de Cinema (em São Petesburgo).

Ptuschko é uma espécie de Ray Harryhausen russo, estando envolvido com a arte cinematográfica desde os anos 20 (sua estréia na direção foi com o curta Propavshaya Gramota, de 1927). Foi animador, técnico de efeitos especiais e diretor ligado ao gênero "Russkaya Fantastika", cinema fantástico russo, tendo realizado obras exuberantes como Sadko, Ilya Muromets e Sampo.

O conto Viy pretensamente deu origem à obra-prima de Mario Bava, A Máscara do Demônio. Apesar de Bava ser fanático por literatura fantástica russa, e o ponto de partida do conto ser admitido por ele como "muito inspirador" (um homem sozinho com um demônio em uma igreja abandonada), ele só aproveitou em seu filme o nome de alguns personagens e o fato de haver uma bruxa na história. Mas seu trabalho acabou influenciando Viy de alguma forma: não é um acidente a atriz principal, N. Kutuzov, ser parecida com Barbara Steele.

Até alguns anos atrás, localizar cópias deste filme em vídeo era uma tarefa das mais complicadas. Só "dupes" de décima geração de gravações da TV russa ou francesa, e afins. O lançamento de um laserdisc japonês facilitou as coisas... para quem entendia russo ou japonês (era falado na primeira língua com legendas na segunda), ou conhecia o conto e não dependia de tradução. Isso começou a mudar em 2001 quando saiu o já mencionado DVD do Russian Cinema Council, com legendas em dez línguas, inclusive... português. Claro, hoje isso é passado, pois Viy foi lançado em disquinho brasileiro.

Carlos Thomaz Albornoz