Ali,
de Michael Mann
Ali,
EUA, 2001
As perspectivas eram animadoras. Dentro do cinemão americano, sempre
hábil em divulgar e preservar mitos, o lendário pugilista
Muhammad Ali receberia finalmente um filme biográfico à
altura de sua grandeza. Não seria o primeiro, pois nos anos 70
o próprio Ali estrelaria o canhestro e egocêntrico O maior
de todos. Existe também uma obscura produção
de TV que vem sendo exibida pelo Telecine. Teríamos agora uma superprodução,
comandada por um cineasta de prestígio, Michael Mann, que, se não
chega a ser especialmente talentoso, tem bom domínio artesanal
e vinha de dois trabalhos interessantes, ainda que pretensiosos em excesso
(Fogo contra fogo e O informante).
Mas tudo fica só
na expectativa. Ao não optar por enfoques extremos, ou seja, não
fazer uma glorificação do personagem, nem apresentar uma
visão desmitificadora, Ali acaba ocupando um insosso meio-termo
que o situa como mais uma entre as diversas cinebiografias que Hollywood
lança vez por outra, dedicadas muitas vezes a figuras de pouca
expressão fora do mundinho americano. Este certamente não
é o caso de Muhammad Ali, mas o filme de Mann quase acaba por situá-lo
como tal. Após uma interessante sequência inicial, onde os
primeiros momentos da carreira de Ali são agilmente alternados
a uma apresentação musical de Sam Cooke (amigo do lutador),
o filme parte para acompanhar 10 anos da vida/carreira de Ali, desde a
luta na qual conquista o primeiro título mundial (ainda usando
o nome de batismo, Cassius Clay), passando pela perda do título
e do prestígio devido à recusa em participar da guerra no
Vietnã, até a mais que célebre luta no Zaire contra
George Foreman. Tudo dentro de um tratamento linear, convencional e rasteiro
que se limita a encenar uma sequência de episódios durante
as mais de 2 horas e meia de projeção.
Para complicar, o
filme perde quando comparado a outros títulos que trataram de boxe
ou de personagens secundários que participaram da trajetória
do pugilista. Então vejamos: lutas de boxe depois de Touro indomável
nunca foram tão bem filmadas; a luta no Zaire e o próprio
Ali ganharam um tratamento quase glorioso no documentário Quando
éramos reis; Malcom X, que aparece tanto quanto o personagem
título durante os primeiros 30 minutos, recebeu de Spike Lee aquele
que talvez seja o melhor filme do gênero nos últimos 15 ou
20 anos; mesmo o empresário picareta Don King foi retratado de
forma mais crítica em um interessante telefilme dirigido por John
Herzfeld, Don King, only in America.
À altura das
reais dimensões de Muhammad Ali, seja como o grande atleta que
foi, seja como a incomparável figura humana que permanece sendo,
temos apenas a rigorosa composição de Will Smith (bem cercado
por um ótimo elenco de apoio onde se destacam Jamie Foxx e Jon
Voight) e a fotografia de Emmanuel Luzbeki. O filme em si está
mais para Adilson Maguila.
Gilberto Silva Jr.
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