Manifestações acerca do fim da Cinemateca do MAM

Por que estou estarrecido?

Por que estou revoltado? Eu não deveria estar surpreso com o fim da Cinemateca do Mam... é a coisa mais previsível nestes tempos de globalização. Mas estou ! Há alguns anos assisti a um documentário sobre Henri Langlois, o fundador da Cinemateca Francesa, o homem que defendeu com sua própria vida suas latas de filme dos nazistas, o homem que, demitido pelo governo francês, voltou ao cargo nos braços da população mobilizada nas ruas contra sua demissão.... Obviamente não é este o espírito dos diretores do MAM.... o espírito heróico dos que amam o Cinema com C maiúsculo....o espírito dos que fundam museus e cinematecas, e não dos que os deixam morrer....não conheço os pormenores da questão, mas não há argumentos que justifiquem a pulverização de um acervo que pertence a uma cidade, a um estado, a nossa história....onde está o governo do Estado...? Onde está o governo do município, mais preocupado m gastar milhões com a griffe Guggenhein do que com a preservação do patrimônio de nossa cidade? Onde estão nossos empresários, nossos ricos, nossos novos ricos que muito bem poderiam se inspirar nos ricos americanos que bancam seus museus a fundo perdido. Eles disputavam e disputam qual faz mais doações aos seus museus. Nos anos 50, Chateaubriand teve que achacar a classe endinheirada de São Paulo para construir o MASP, hoje patrimônio incalculável para nosso país (e para São Paulo) - parece que nada mudou... E nós, cariocas, amantes do cinema, estudantes de cinema, cineclubistas, documentaristas, nós que precisamos dessa cinemateca, onde estamos ??? Vamos deixa-la morrer assim, na frieza de uma notícia de jornal, dada como fato consumado em cima da hora, como sempre acontece nesses tempos globalizados ? Por que não foi feita uma campanha para doações para manter a cinemateca ? Por que a situação não veio a público antes, a tempo de salvar a cinemateca ? A quem interessa o fim da cinemateca ? Não a nós, com certeza..! .. vamos nos inspirar em Henri Langlois e salvar a Cinemateca !!!!! A quem, afinal, interessa o fim da cinemateca ???

Marcelo Ferreira da Silva
Iêda Rozenfeld Olhovetchi

Réquiem para uma cinemateca

É assustadora a quebra da confiança no MAM diante do anunciado "despejo" de 48 mil latas de filmes, a serem irrevogavelmente retiradas de suas dependências nos próximos meses.

Essa é uma questão da maior gravidade não somente para as autoridades e agentes culturais, como para toda população do Rio de Janeiro.

Pragmaticamente, a solução exigida atende à mais elementar relação de 'custo x benefício': equipar o Rio de Janeiro, o principal pólo produtor audiovisual do país, que movimenta milhões de
dólares anuais, de condições técnicas e gerenciais adequadas à conservação de suas matrizes, a essência de seu investimento. Para a construção de um arquivo climatizado foi estimado o custo de 3 milhões de reais, valor equivalente a de uma única produção
cinematográfica de médio porte.

Assim, a viabilização desse arquivo se configura como uma questão de compromisso e competência dos empresários do setor audiovisual, compreendido aí o cinema, a publicidade e a televisão, e as autoridades do município, do estado e do governo federal, e da recém-criada ANCINE.

Contudo, algo mais irrecuperável aconteceu. A implantação de um novo arquivo não poderá remediar a perda de um ideário de cinemateca, construído por cineastas, pesquisadores, funcionários e amantes de cinema. Ao longo de décadas, e com o aporte de
consideráveis recursos públicos, cumpriu-se um efetivo compromisso com o fazer, divulgar e preservar imagens brasileiras.

Foi por força desse ideário que a Cinemateca ocupou seu destacado lugar na vida cultural da cidade, promovendo mostras, ciclos e debates, reunindo e organizando livros e documentos, recolhendo,
preservando e restaurando filmes antigos e contemporâneos, homenageando cineastas consagrados e suas obras e estimulando os novos talentos.

Com o anuncio do despejo, rompe-se definitivamente com esse compromisso e esvazia-se aquele espaço de seu significado original.

É imperioso, portanto, dotar o Rio de Janeiro de novos e revitalizados espaços, onde se possa compartilhar o prazer de produzir e assistir imagens brasileiras.

Ana Pessoa, pesquisadora, ex-funcionária da
Cinemateca do MAM