O Último Lance,
de Marleen Gorris


The Luzhin Defence, Inglaterra/França, 2000

Marleen Gorris inicia seu filme com uma inegável sensação de um autêntico épico clássico de cinema, com direito a trilha sonora em tons exagerados, montagem rápida, filmagem grandiloquente. Longe de querer fazer disso um problema, porque o cinema épico já serviu a belos filmes do cinema mundial. A grande questão é que retomar hoje a linguagem do cinema épico mais clássico, aquele de grandes vilões, tramas rocambolescas e inacreditáveis e um romantismo atroz pede, no mínimo, alguma auto-crítica por se tratar de um gênero por si mesmo já mais do que referido e deglutido. E é isso que se passa duas horas esperando de O Último Lance, sem que nunca chegue. O filme comete o pecado mortal de se falar absolutamente a sério e a tratar, em plenos anos 2000, o espectador como se ele ainda estivesse nos anos cinquenta.

Claro que há alguns elementos de interesse, como o próprio jogo de xadrez como força motriz da trama, mas são todos diminuídos ao nível do clichê mais óbvio, elementar, cansativo, e pior, eventualmente risível. Emily Watson e John Turturro parecem não acreditar por um momento que estão brincando daquele joguinho, talvez se divertindo apenas em interpretar como se estivessem no teatro, ou no cinema dos anos 50. Mas a diretora não embarca em nenhuma "brincadeira" do tipo, tanto que leva absolutamente a sério um dos mais bizarros personagens saídos do cinema moderno, o Valentinov interpretado por Stuart Wilson, que é o mais mau dos vilões visto na tela em anos e anos, sem que o filme peça por um momento a sua existência. Todas as vezes em que ele está em cena, a credibilidade do todo é jogada por terra. Mas não é o único clichê ambulante. Temos também o adversário estrangeiro arrogante mas digno, o concorrente amoroso que parece uma "dama" de tão compreensivo, os pais preconceituosos da mocinha. Podia-se de fato estudar os personagens deste filme para qualquer tese mais aprofundada sobre os estereótipos na construção de personagens.

Nenhum, com certeza, barraria o personagem principal. O gênio que não consegue estabelecer relações sociais, auto-centrado, marcado por um passado traumático e um tirano que o destrói para a vida. Há cenas de antologia como o carro sendo parado no caminho do casamento, como o jogo sob efeito "psicológico" de Valentinov, como todo e qualquer flashback, que parecem ter sido feitos de brincadeira, mas infelizmente não são. Mas, nada que se compare à cena onde montagem paralela relacionam sexo com o jogo de xadrez, uma cena que se os irmãos Zucker tivessem usado num dos seus filmes-deboche não seria tão hilária. É isso que o filme é: risível em seu anacronismo. Se bem que pensando bem... olha, parece que tem coisa aí! Será que Mel Brooks não assinou com outro nome uma paródia de Karate Kid?? A história é parecidíssima, mas não teria nada mais engraçado do que pensar: "E se ao invés de karatê usássemos... xadrez??" O espectador paga com duas horas o preço desta piada, definitivamente de mau gosto.

Eduardo Valente