Italiano
Para Principiantes,
de Lone Scherfig
Italiensk for begyndere,
Dinamarca, 2000
Italiano Para Principiantes
é o 12º filme com o certificado do Dogma, os famosos mandamentos
de Lars Von Trier por um cinema urgente, barato e realizados quase documentalmente
(luz natural, obrigatoriedade de não interferir nas locações).
Mas entre Festa de Família e Os Idiotas, os primeiros
filmes realizados nessas condições, e Italiano Para Principiantes
(e os demais filmes-dogma), há uma brutal diferença de qualidade,
de inovação e de intenções. Os primeiros filmes
desse manifesto chegaram ao Brasil em 1998, causando sensação
e profundos choques estéticos na platéia, trazendo inúmeros
problemas de representação, da relação entre
forma e conteúdo, entupindo a tela de um forte grão (devido
às restrições de iluminação do Dogma),
uma sujeira formal que se adequava incrivelmente com a lavação
de roupa suja familiar (Festa de Família) ou com o retrato
preconceituoso e sem vida da classe média dinamarquesa (Os Idiotas).
Italiano Para Principiantes
está despido de todos esses problemas. Não porque se trate
de uma doce comédia sobre amores na adversidade, muito menos porque
todo o lado "sujo" da sociedade dinamarquesa desapareça
nos primeiros minutos do filme, com a incrível morte de vários
personagens ao mesmo tempo. Mas simplesmente porque o filme não
constrói nenhuma linguagem, não propõe ao espectador
nenhuma experiência, ele simplesmente coloca diante da tela alguns
bons atores e aposta que isso seja suficiente para realizar um bom filme.
Não é. Ao ver Italiano para Principiantes, tem-se
a triste impressão de que todas as formas expressivas do cinema
que incluem montagem, enquadramento, duração de plano,
fotografia, direção de arte, figurino, entre tantos outros
são radicalmente reduzidas a pó, e que infelizmente
a diretora do filme esqueceu de colocar qualquer coisa no lugar.
O filme começa
confrontativo, cheio de discussões entre familiares, o que nos
remete de início a Festa de Família e à triste
má interpretação de que o Dogma deveria ser sobre
as "verdades profundas" que vêm à tona, como o
também péssimo O Rei Está Morto. Mas não:
os familiares desagradáveis morrem um a um e os personagens, outrora
sufocados, têm agora a chance de se entregar ao amor. Os casais
vão aos poucos se formando e tudo converge para um curso de italiano
subvencionado pelo governo, numa sala de aula onde "estão
interpretando um musical" (menção a Dançando
no Escuro e única piada boa do filme). No fim, um deus ex-machina
garante a todos os felizes casais uma viagem para Veneza. Mas o dramático
mesmo é tentar encontrar algum foco de interesse, alguma graça
na realização desse filme que nunca sai do óbvio,
em momento algum penetra em terreno desconhecido e, pior de tudo, procede
uma desnecessária operação de tábula rasa
em tudo que uma vez já foi linguagem do cinema. Quem diria: aquele
"boom" inicial que serviu para renovar a linguagem e recolocar
a mise-en-scène e os processos de produção
cinematográfica em questão acabou se tornando, nas mãos
de diretores sem talento ou cuidado, o maior inimigo do cinema: o grau
zero de expressividade.
Ruy Gardnier
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