Éden,
de Amos Gitai
Eden, Israel, 2001
Desde o começo,
a assinatura:
o filho conversa com o pai, os dois de frente para a câmera, os
olhos não se encontram. Eles conversam sobre os rumos de sua vida
e da guinada que o filho quer dar na vida: ele muda-se e quer investir
pesadamente na construção de uma cidade na Palestina. Éden
situa-se antes da Segunda Guerra Mundial, com os primeiros esforços
de alguns judeus para retomar uma vida em sua terra sagrada, desolcando-se
por continentes para fortalecer a causa sionista. Como sempre em Amos
Gitai, os planos são fixos e longos, a luz é natural, preferencialmente
calcada no branco e em cores neutras (marrom, cinza). Mas algo parece
errado em Éden: não, não é a linguagem
minimal do relato histórico, que nos aparece nos discursos dos
personagens ou pelo rádio, mas antes o sentimento de que Gitai
não tem muita vontade de filmar várias das coisas que se
passam diante da tela.
Adaptado da obra de
Arthur Miller Homely Girl, que relata alguns anos da vida de uma
mulher que tem em volta um marido que dedica mais tempo à construção
da nova cidade do que a ela. Bem, por mais que isso apareça em
Éden, Amos Gitai não parece dar muita atenção
à vida dela, e sim ao (importante, certamente) background
histórico dos primeiros povos que deram início à
reocupação da palestina que vai depois da guerra resultar
no Estado de Israel. Mas, ao contrário de Kippur, a vida
dos seres humanos que Gitai filma em Éden parece importar
pouco diante da situação em que eles vivem. É, no
fundo, a idéia de reconstrução do sonho sionista
que parece importar a Gitai, que cada vez mais parece assumir para si
uma dimensão de cineasta dos dilemas e da memória do povo
israelense. E, de fato, as mais belas imagens do filme são as da
reconstituição das obras para a construção
de uma rua na Palestina. Filmado com o mesmo distanciamento elegante já
mostrado em seu filme anterior sobre a Guerra do Yom Kippur, Éden
parece entretanto apenas seguir a priori a forma de encenação
já encontrada por seu autor, dando a sensação que
a estrutura dos planos e da narrativa impõem-se arbitrariamente
àquilo que é contado.
A vida dos personagens
e sobretudo os dilemas da protagonista, interpretada por uma excelente
e pouco aproveitada Samantha Morton é irrisória diante
da fria câmera de Gitai, que outrora já foi tão caloroso
(em Kadosh ou nas cenas iniciais/finais de Kippur) mesmo
mantendo sua encenação muito rigorosa. O que só atrapalha
Éden, porque observamos que é a forma bem acabada
de um diretor talentoso que trabalha no vazio, de forma quase acadêmica.
Poderíamos esquecer de tudo isso no plano final, onde um simples
travelling para a esquerda modifica toda a nossa visão do filme
e nos remete para o presente, e revela para quem ainda não
tinha percebido a intenção de Amos Gitai: filmar
os primórdios de Israel e a mutação que esse país
vive hoje. Mas o que guia esse último plano é um passeio
de Samantha Morton, e ao mesmo tempo que observamos a mudança geográfica,
percebemos que saímos do filme sem nos importarmos minimamente
(e Gitai evidentemente nos segue) com os caminhos e descaminhos da personagem
principal. O caráter meramente caricatural dos personagens de Éden
mina toda a possibilidade da construção de um verdadeiro
filme. Resta o esboço.
Ruy Gardnier
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