Cronologia da crítica
cinematográfica no Brasil
1896 No dia
8 de julho, diversos jornais comentam a primeira exibição
pública do Omniographo, que se deu à Rua do Ouvidor, 57,
no Centro do Rio de Janeiro.
1897 No dia
17 de julho, o crítico teatral Arthur Azevedo publica em "O
Paiz" comentários sobre os filmes que passam em casas teatrais.
A constante preocupação com o comentário desses filmes
faz de Arthur Avezedo o primeiro crítico brasileiro.
1904 Na revista
Kosmos, o poeta e escritor Olavo Bilac publica um texto falando sobre
a revolução que o cinematographo deve se tornar: "O
livro está morrendo. O livro do futuro, para ensinar as populações
(...), é o cinema". Será a primeira investida de um
intelectual brasileiro acerca do cinema.
1913 Cinema,
revista impressa em Paris, é o primeiro periódico brasileiro
a contar com comentários sobre filmes, ao contrário das
outras revistas, que apenas exibiam fotos e textos de divulgação.
Durou apenas um ano.
1918 Em março
desse ano nasce a revista Palcos e Telas, primeira revista brasileira
com críticas tenta dar conta dos filmes em cartaz.
1924 É
o ano em que Pedro Lima (autor do célebre "Todo filme brasileiro
deve ser visto por todos"), primeiro jornalista especializado na
cobertura do cinema nacional, lança na revista Selecta a
coluna O Cinema no Brasil, considerada a primeira tentativa ordenada
de se tentar compreender as dificuldades econômicas e o atraso técnico
da produção brasileira.
1926 A trajetória
de Cinearte é um dos fenômenos mais complexos e mal estudados
da história do cinema brasileiro: ao mesmo tempo em que se autodefinia
como "o natural intermediário" do público com
Hollywood, a revista de Adhemar Gonzaga e Mário Behring foi também
a primeira (e desde seus números iniciais) a realizar uma campanha
combativa em favor do cinema nacional, mostrando uma nítida vontade
de ação prática e local que iria culminar com a
criação dos estúdios da Cinédia, fundados
por Gonzaga. Editada até 1942.
1928 O Chaplin
Club publica O Fan, primeira tentativa crítica de olhar
o cinema como "grande arte". Editada por Otávio de Faria,
Plínio Sussekind Rocha, Cláudio Mello e Souza e Almir Castro,
O Fan é o primeiro periódico de cinema a surgir exclusivamente
por amor cinefílico. Durará até dezembro de 1930.
1930 Jonathas
Serrano publica o primeiro livro de autor brasileiro sobre cinema: Cinema
Contra Cinema. Trata do combate do cinema educativo contra o cinema
comercial, numa tentativa de compreender a arte cinematográfica
como instrumento pedagógico. O livro seguiu-se à primeira
exposição de cinema educativo, em 1929, com organização
do próprio Serrado e de Cecília Meirelles.
1931 Pedro
Lima, ao escrever regularmente para jornais, torna-se o primeiro crítico
diário e passa a ser temido e admirado por sua posição.
É certamente com Pedro Lima que surge a figura do crítico
de cinema tal como entendida hoje.
1941 Em maio
de 1941, começa a circular a revista Clima, iniciativa do
grupo de estudantes herdeiro dos modernistas (Mário de Andrade
é o fiador intelectual e escreve a apresentação
na primeira edição) e reunido em torno da Faculdade de Filosofia
da USP entre eles estavam Antônio Cândido, Décio
de Almeida Prado, Lourival Gomes Machado e Paulo Emílio Sales Gomes,
que ficou encarregado da seção de cinema. Durante seus 16
números, Clima foi o veículo da renovação
das atitudes críticas no Brasil, com uma clara e inédita
proposta de discussão e atuação nos rumos da cultura
nacional.
1942 Cinema
mudo X cinema falado: foi Vinícius de Moraes quem levantou a bola
em sua coluna no jornal A Manhã, polêmica cujos estilhaços
se espalharam durante vários meses e até Orson Welles,
no Brasil para filmar Its All True, foi chamado a dar sua opinião
como defensor dos chamados talkies. Discussão abstrata e
anacrônica, sem dúvida, mas que contribuiu para elevar a
qualidade do debate sobre o cinema, debate sem muito brilho por estas
bandas desde o fim de O Fan.
1946 Começa
a escrever no Correio da Manhã Antonio Moniz Viana, nosso
mais importante crítico de imprensa diária. Sem ser teórico
ou acadêmico, Moniz Viana foi o primeiro crítico a conseguir
status de intelectual do cinema e desenvolveu um método
próprio, com muitas idiossincrasias, de odiar a chanchada e o Buñuel
mexicano até adorar William Wyler. Escreveu durante 28 anos no
Correio, só terminando sua coluna quando do fim do jornal.
Além de crítico, foi diretor da Cinemateca do MAM e intenso
animador intelectual.
1951 Nos anos
50, Almeida Salles escreveu que Belo Horizonte, mesmo sendo uma cidade
sem produção de filmes, ainda assim possuía a melhor
crítica de cinema do país e esse movimento tem seu marco
inicial em 1951: a fundação do Centro de Estudos Cinematográficos
de Minas Gerais, com Cyro Siqueira e Jacques do Prado Brandão na
linha de frente do grupo. Entre muitas outras atividades, o Centro foi
responsável pela edição da Revista de Cinema,
considerada por muita gente boa a mais importante da época.
1952 Acontece
no MAM de São Paulo a Primeira Retrospectiva do Cinema Brasileiro,
até hoje considerada um marco pioneiro dos estudos históricos
sobre o cinema nacional. Além dos trinta filmes exibidos, muitas
raridades entre eles, foi também editado um catálogo de
grande significado pelo que denunciava sobre o descaso e a debilidade
da pesquisa histórica no país. Dois anos mais tarde houve
uma segunda edição da Retrospectiva.
1955-6 O biênio
marca as duas tentativas iniciais de se articular uma visão do
conjunto da cinematografia brasileira. Em 1955, Francisco Silva Nobre
lança a Pequena História do Cinema Brasileiro, muito
mais uma cronologia ou breve súmula do que um olhar crítico
Paulo Emílio escreve: "o livro promete mais do que cumpre".
No ano seguinte é a vez de Adhemar Gonzaga publicar no Jornal
de Cinema os dois primeiros capítulos de sua História
do Cinema Brasileiro, projeto que infelizmente não teve continuidade.
1956 Walter
da Silveira, já crítico em A Tarde e no Diário
da Bahia, funda o "Clube de Cinema", que será o elemento
aglutinador para o nascimento das discussões acerca de cinema na
Bahia. Guru de Glauber Rocha, Walter da Silveira é também
um dos mais finos e acurados críticos de todo o cinema brasileiro.
1960 Glauber
Rocha publica no Suplemento Literário do Jornal do Brasil uma série
de artigos que tentam dar conta do nascimento de um novo cinema no Brasil.
Considerando os filmes Aruanda (de Linduarte Noronha) e Arraial do Cabo
(de Paulo Cezar Saraceni) como marco zero de uma nova cinematografia no
Brasil, Glauber Rocha enuncia diversos postulados do cinema novo, entre
os quais "uma câmara na mão, uma idéia na cabeça".
1960 Faz-se
o 1ͺ Convenção Nacional de Crítica Cinematográfica,
em São Paulo. É a primeira oportunidade em que um encontro
nacional se dá, envolvendo críticos desde o sul até
o norte do Brasil. A tese "Uma Situação Colonial?", de Paulo
Emílio Salles Gomes, faz sensação, e será
o ponto nevrálgico de seu texto mais famoso, "Trajetória
no Subdesenvolvimento".
1962 O Cinema
Novo mal explodia nas telas e Alex Viany sempre um dos críticos
mais atentos ao cinema brasileiro publicava na revista Senhor
o primeiro artigo a tentar dar conta da jovem geração de
realizadores que surgia: Cinema Novo, Ano 1, recentemente reproduzido
no livro O Processo do Cinema Novo. Em 65, o mesmo Viany retomava
dessa vez com mais conhecimento de causa as questões da ruptura
estética do grupo em outro artigo fundamental, O Velho e o Novo.
1962 Ainda
em 62, dentro do debate sobre a representação do nacional-popular
e da necessidade de conscientização do povo, surgem os primeiros
conflitos entre o Cinema Novo e o CPC, com Carlos Estevam Martins defendendo
a chanchada (fato inédito entre intelectuais) contra as "vedetes
do cinema empenhado" que, segundo ele, não conseguiam nenhuma
comunicação útil com as massas. Os cinemanovistas
respondem citando Maiakóvski: não há arte revolucionária
sem forma revolucionária.
1965 Com o
crítico Paulo Emílio Salles Gomes à frente do projeto
(que incluía também Jean-Claude Bernardet e Nelson Pereira
dos Santos entre os professores), 1965 marca a fundação
do curso de Cinema da Universidade de Brasília, primeira e ambiciosa
experiência do gênero no país e que foi prematuramente
abortada pelos ecos do AI-5. Numa tentativa em grande parte bem-sucedida
de reeditar o modelo didático, a partir de 68 parte do núcleo
de professores se transferiu para a Escola de Artes da USP.
1966 É
fundada a revista Filme Cultura (originalmente Filme & Cultura). Ela
será durante vinte anos o campo principal dos debates estéticos
da geração dos anos 60. Aos poucos, foi-se tornando exclusivamente
sobre cinema brasileiro. Inicialmente com intenções bimestrais,
foi ao longo da década de 70 se assumindo como "devezenquandário".
1972 Torquato
Neto, que em 1971 começa a assinar a coluna "Geléia Geral"
no Última Hora, cede seu espaço a Ivan Cardoso para que
publique "Mixagem Alta Não Salva Burrice", um manifesto contra
os rumos do cinema novo, que se institucionalizava, e a favor de uma "estética
marginal subdesenvolvida" só possível no cinema marginal.
1973 Paulo
Emílio Sales Gomes publica no primeiro número de Argumento
seu mais importante e deflagrador ensaio, Trajetória no Subdesenvolvimento,
tentativa pioneira de analisar o cinema brasileiro como fenômeno
que não escapa a uma tradição nacional coagulada
no subdesenvolvimento e no atraso. A partir de 1978 o artigo foi diversas
vezes republicado como livro, versão acrescida de mais duas partes.
1975 Nasce
a revista Cine Olho, único periódico de relevo dedicado
aos problemas estéticos suscitados pelo cinema marginal. Inicialmente
surgida entre alunos da PUC-Rio com exemplares mimeografados, foi aos
poucos agregando diversos nomes importantes de outros estados e assumindo
mais cara de revista. Não chegou, entretanto, a dez números.
Acabou em 1980.
1983 O "Folhetim"
da Folha de São Paulo, principal suplemento cultural na grande
imprensa dos anos 80, incorpora a área de cinema como área
de reflexão. Marcou sua época por tentar atualizar o debate
sobre reflexão e realização cinematográficas.
Traduziu mainfestos, serviu de palco para intervenções de
diretores e publicou edições especiais, entre outros, sobre
Limite, Godard, Eisenstein e Wim Wenders.
1986 Os jornais
vêem mais e mais ser diminuído o espaço destinado
à crítica de cinema. No Rio, o jornalista Rogério
Durst desenvolve um estilo que fará escola até hoje: poucas
ambições críticas, escrita descontraída, texto
curtíssimo, preferência acima de tudo pelo entretenimento.
1987 O fim
da revista Filme Cultura, que até então estava restrita
a uma edição por ano, deixa na crítica cinematográfica
a triste lacuna de não haver qualquer espaço dedicado à
reflexão cinematográfica no país. A partir daí,
o pensamento sobre cinema se dará exclusivamente nas faculdades
de comunicação e nos (poucos) textos publicados em jornais.
1996 No combalido
terreno da crítica dos anos 90, poucas são as iniciativas
dignas de nota entre elas a publicação do número
1 da revista Cinemais (setembro/outubro), que vem renovar um filão
já retomado em 94 por Imagens, editada pela Unicamp. Cinemais
é um periódico bimestral de cunho acadêmico que tenta
reabrir a discussão em torno do cinema no Brasile na América
Latina. A maior parte dos textos é fornecida por professores de
escola de cinema.
1999 Fogos
contra a crítica: desde 1992, um grande número de intelectuais
revela seu descontentamento com a imprensa cultural. Os principais porta-vozes
desse desagravo são Caetano Veloso e Carlos Diegues. Segundo eles,
os críticos dos grandes jornais são despreparados e mal-intencionados
com a arte feita no Brasil.
Ruy Gardnier e Juliano
Tosi
(A composição dessa cronologia teria sido impossível
sem a colaboração de Hernani Heffner)
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