Vatel,
de Roland Joffé
Vatel, França/Inglaterra,
2000
Geralmente o pior comentário que se
possa ouvir na saída de um típico filmão de reconstituição
de época caríssima é: "Bonito". Todo um
conceito costuma estar escondido nesta simples palavrinha, e podemos esperar
um filme absolutamente estéril, sem qualquer tesão ou coração,
mas interessado em gastar bem os dólares (ou francos ou libras),
e impressionar seu público com grandes cenários, figurinos,
fotografia. Pois bem, quando saí deste filme de Roland Joffé
e me perguntaram o que achei me peguei dizendo: "Bonito". Ao
ver o que tinha saído de minha boca, fiz questão de me explicar
melhor, para que ele não caísse numa vala comum, que certamente
não merece.
Porque se no caso de Vatel dizemos
ser o filme bonito, é porque o tema principal do filme lida exatamente
com isso. E não poderia ser diferente. Ao invés de apenas
servir de cenário para o filme, o luxo que o cerca vira assunto
do filme, de forma quase metalinguística. Para melhor entender,
precisamos explicar a história: Vatel, interpretado (belamente
como já não fazia há tempos) por Gerard Depardieu
é um mestre de cerimônias, um grande "produtor"
de eventos de um nobre francês. Pois bem por motivos políticos,
este nobre vai receber a côrte do rei em seu palácio por
4 dias e Vatel é responsável pelo andamento perfeito das
várias celebrações que acontecerão (banquetes,
encenações, acomodações, jogos), para que
o rei fique impressionado com o tratamento, o que incidirá em maiores
favores para o mestre de Vatel. A partir deste argumento o que vemos é
uma festa para os olhos (afinal o que Vatel monta deveria impressionar
um rei), mas muito mais do que isso.
Aí é que o filme ganha complexidade
e significado. Ele é um grande ensaio (quase teórico, se
bem visto) sobre o papel do artista, até onde se deve ir para criar
o belo, qual a verdadeira razão para isso, qual a recompensa que
busca o artista. Para isto, o diretor usa uma mistura de fina sátira
social sobre os papéis de cada um na côrte, e as relações
(desde sexuais até sociais), com a apresentação grandiosa
das festividades, ajudadas pela estupenda trilha de Ennio Morriconne.
Há cenas efetivamente sublimes, como o empregado que acaba enforcado
por acidente, como consequência de uma encenação,
até o final onde Vatel, confrontado com o fracasso, toma a atitude
derradeira de um verdadeiro perfeccionista. A extravagância final
não é mostrada, numa linda elipse, na qual Joffé
parece dizer que há coisas mais importantes do que a busca do belo.
O que, voltando ao início, parece um sutilíssimo comentário
sobre produções como as que este mesmo filme representa.
Uma surpresa, por se tratar de um filme muito bem contado, mas que tem
muito a dizer.
Eduardo Valente
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