8½ Mulheres,
de Peter Greenaway


8½ Women, EUA, 1999

Os momentos mais bonitos de Oito Mulheres e Meia estão, certamente, em sua primeira hora de projeção: Triste pela morte da mulher, um velho banqueiro suíço se reencontra com seu filho, no casarão onde vive, e passa por momentos de intimidade que nunca haviam tido. Nas palavras do pai com seu filho, e vice versa, há uma aproximação inusitada e rara entre dois personagens masculinos que, sem perder sua masculinidade, se entregam um ao outro com extrema doçura. Nus diante do espelho, os dois homens falam de seus corpos, da relação que têm com seu sexo e com o sexo oposto, da sensação de ver no corpo do outro uma extensão de suas próprias vidas. Uma dimensão de cumplicidade e cuidado com o outro, a Amizade elevada ao ápice de sua potência... Eles estão tristes, e sozinhos, e dormem nus abraçados um ao outro... Greenaway cria imagens de beleza deslumbrante a partir dos corpos de seus personagens ali parados, pensativos, sentados diante da piscina... Um filme que não fala das oito mulheres e meia do título, mas dos Homens e da masculinidade, do desejo masculino: como na referência à relação de Fellini com suas mulheres deslumbrantes... Ou no inusitado depoimento do velho, ao concluir que seu desejo de um dia ser engenheiro provinha da reincidente visão do grande pênis que seu pai possuía... Com muita sensibilidade e humor, Greenaway fez uma primeira hora de filme raríssima, com passagens e diálogos que entram a fundo no universo sexual masculino; um universo, geralmente brutalizado e menosprezado...

É uma pena que, logo após a bela cena do teatro japonês, o filme pareça se perder: nas fantasias dos dois homens, no absurdo daquelas mulheres, na confusão daquele casarão transformado em harém, no sentido confuso que seu título ganha com a presença daquela estranha meia mulher... O filme parece mal construído desse ponto em diante e perdemos de vista a relação entre pai e filho, a mais interessante desde o início. Em sua conclusão, um tanto quanto moralista, Greenaway acaba por fazer um filme abaixo do esperado de um diretor responsável por obras como O Bebê Santo de Mâcon e O Livro de Cabeceira (onde, aliás, a relação é a inversa: uma mulher busca em inúmeros amantes, sua realização sexual).

De qualquer forma, é um belo filme, cravejado de imagens belíssimas, algumas pérolas de diálogo e alguns elementos difusos ainda a serem pensados em sua estrutura. Um filme que, pelo menos por sua primeira hora, vale a pena ser apreciado.

Felipe Bragança