Inácio Araújo
Folha de S. Paulo

Quantos filmes você vê por ano ou por mês? O que pensa desta quantidade? Qual a sua relação com o circuito comercial?

Não conto há muito tempo. Mas não gosto de ver muitos filmes, não. Tenho a impressão de me perder, quando vejo quatro, cinco filmes num dia. Só em situações muito excepcionais consigo fazer isso, por necessidade absoluta. No cotidiano, acho que ver mais de um filme por dia é exagero, no DVD ou no circuito comercial. O circuito comercial, por sinal, está horrível.

Que qualidades você valoriza em um crítico?

Não sei mais dizer. Desculpe. São tantas. Mas penso que não perder o humor é essencial. Ele pode nos dar uma visão mais longa. E nos dá também mais paciência. O crítico é um olhar. Tem que ter liberdade. Acho que também tem de saber escutar mais a voz dos outros do que a própria. A crítica é um diálogo, afinal.

Enquanto crítico, você pensa no que ficará de um filme daqui a 10 anos?

Pensar nisso equivale a pensar no tempo futuro, o que é impossível. O tempo modifica os filmes, o futuro afeta o passado. Por isso 10,20 anos é o tempo mínimo para saber o que restará de um filme, se ele crescerá ou desaparecerá (mas talvez retorne depois...), se ele interpretou o seu tempo de maneira mais ou menos rica do que pudemos perceber no momento... Algumas coisas creio que são, no entanto, de ordem objetiva e independem do tempo ou dependem mesmo: a inventividade, a fluência, a integridade, o conhecimento de sua arte...

Como você avalia a influência da crítica no meio cinematográfico (realização, distribuição, público etc.)?

Não quero ser pessimista, mas acho que o meio cinematográfico considera o crítico um inimigo. Grosso modo, claro. Não está muito errado: considerando a irrelevância atual de nossos filmes é melhor que sejam inimigos mesmo.

Quem é o público leitor de crítica? Você pensa de que maneira serão recebidos seus textos?

Não sei. Quando comecei na Folha, era um jornal pequeno, mais ou menos tinha idéia. Hoje é um jornal de massa, com público heterogêneo, não sei quem possam ser os leitores. No blog é uma coisa mais íntima, tenho a sensação de falar a amigos.

Você considera que a crítica é influenciada pela visão política e por valores pessoais? Como você avalia isso?

Sim, é. Ninguém pode abdicar da subjetividade, da experiência pessoal. Objetivos são robôs.

O que o leva a ler/escrever uma crítica?

A escrever: é uma troca que se propõe. A ler: quando uma troca é proposta; quando tenho a sensação de aprender.

Considera que, no seu trabalho crítico, há uma diferença de abordagem para os filmes brasileiros?

Espero que não.

Diga honestamente o que você pensa do panorama da crítica de cinema no Brasil hoje. É positivo ou negativo?

O que eu acho da crítica é: toda a indústria faz todo o possível para que ela perca o sentido. No caso brasileiro, acho que boa parte de sua energia vem de resvistas online, como a Contra, que trouxe um novo olhar, e as que vieram depois.

Existe também uma pressão da universidade, sobretudo sobre os críticos surgidos recentemente. Por um lado, é muito bom: aprofunda-se o con hecimento. Mas é preciso que a crítica não perca sua característica de imediatez e, de certa forma, de combate.


 Abril de 2013