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Wong Kar-wai: Perfil

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WONG KAR-WAI

Há uma tendência a qualificar o cinema de Wong Kar-wai como puramente formal, como mais um dos joguinhos pós-modernos bem à maneira de Peter Greenaway. Nesse sentido, ele estaria colocado mais na posição dos "estetas" do cinema (John Woo, Robert Rodriguez, Michael Winterbottom) do que na dos "diretores" (Clint Eastwood, Abel Ferrara, Youssef Chahine). Puro engano: Wong participa de uma linha de cinema que abandona todo o esteticismo e prol de uma verdadeira "estética", um domínio em que todos os elementos visuais têm como primeira função significar, para num momento depois serem "bonitos". Dessa forma, Wong se aproxima muito mais do cinema dos "diretores".

Mas, mesmo assim, não seria interessante situá-lo como tal. Pois, afinal, existe todo um conjunto de cineastas que utilizam a forma para significar, e é a esse grupo que Wong faz parte: um grupo que agrega Jean-Luc Godard, Jim Jarmusch, Tsai Ming-liang, David Lynch. Pois como ver seus filmes sem percebermos que os enquadramentos, os diversos filtros utilizados, a película altamente granulada, todos os usos expressivos que faz da música (a ponto de repeti-las à exaustão em Amores Expressos) estão em perfeita afinidade com o universo de seus personagens e com o próprio relato?

Pois é a lógica do sujeito mínimo que parece dominar a maioria de seus filmes. Num mundo em que tudo é informação (e lembremos que Hong-Kong é provavelmente o lugar em que isso mais ocorre, mais até do que nos Estados Unidos), em que todas as coisas "significam" mais do que as pessoas, o que resta é realizar uma nova economia do indivíduo: por isso seus personagens solitários, extremamente necessitados de relacionamentos, mas que nunca conseguem levá-los muito longe (o personagem principal de Felizes Juntos no final acaba encontrando a família de seu amigo, mas tudo que ele faz é pegar uma fotografia: se ele quiser encontrá-lo, sabe onde achar...). Mas em que esse mundo irrequieto, de desejos fugazes e vontades irrealizadas vai juntar-se ao processo de filmagem/montagem? Resposta: na sociologia de Wong. Wong é solciólogo quando cria uma forma fugaz para observar seus personagens. Pois somente entendendo a realidade que Wong cria é que podemos entender seus personagens. Wong está em perfeita afinidade com a história contemporânea: pois se nosso momento atual é o das 'pequenas histórias' (história da juventude, história da vida privada, história da vida íntima), não há cineasta que saiba filmar isso melhor que ele atualmente. Pois, mais que os personagens, vemos objetos: um abatjour com desenhos de cascata, uma lata de pêssego, uma van que vende de sorvetes. Isso para não falar nos próprios momentos de vida indoors que vemos em Felizes Juntos e Amores Expressos. Filmando um mundo em que os objetos sempre falam mais que os seres, Wong nos apresenta uma matemática estranha: 1+1 quase nunca resulta 2. Mas é através de seus filmes que seus personagens vão tentar viver felizes com a pessoa amada.

Ruy Gardnier

Filmografia de Wong Kar-wai:

1988    As Time Goes By

1990    Nossos Anos Selvagens (Days Of Being Wild)

1994    Cinzas do Passado (Ashes Of Time))

1994    Amores Expressos (Shungking Senlin)

1995    Anjos Caídos (Fallen Angels)

1997   Felizes Juntos (Happy Together)