Paixão Perdida, de Walter Hugo Khouri
(Brasil, 1998)

Paixão Perdida é o mais novo filme de Walter Hugo Khouri, cineasta que merece respeito menos por sua obra do que pelo fato de realmente ter conseguido constituir uma, um "universo", se assim queremos. Mas a questão WHK não é tanto saber se ele é um cineasta-autor, e sim tentar compreender que tipo de cineasta-autor ele é. Sabemos que até em seus filmes mais apelativos podemos encontrar traços característicos de sua obra, como a falta, o tédio, a ausência de objetivos na vida, a efemeridade da existência, etc. Pensar-se-ia constituir isso um trunfo: quantos cineastas brasileiros carregam em sua obra identidade tão constante! Tão constante que chega à tautologia, diriamos... Longe de considerarmos Khouri como um não-autor, o que nos aflige e incomoda em sua obra é o fato de ser autor demais.

Tomemos Paixão Perdida, filme dos mais autorais de sua carreira. O personagem Marcelo, que vemos ao longo da extensa obra do diretor, é aqui dobrado. Um é o pai, profissional bem-sucedido; outro é o filho, que — estigma khouriano levado à sua máxima (ou mínima) potência — ficou paraplégico e sem fala graças a um acidente primordial, a perda da mãe. Se o Marcelo pai nos parece menos frustrado, é uma impressão puramente externa, superficial, pois no fundo (e isso é o próprio Khouri que frisa) ele também é movido pela perda. Não uma perda determinada, curável, mas uma perda fundamental, talvez o abandono de Deus, talvez a castração, talvez a angústia do existencialismo alemão.

Existencialista-idealista, Walter Hugo Khouri transforma o cérebro do espectador em palco psicanalítico para seu jogo de vaidades & veleidades, e também de narcisismo. E se Paixão Perdida nem passa perto do abominável As Amorosas, ganha desse no quesito obscurantismo. Trata-se de uma pedra. Marcelinho olha para a pedra depois que papai Marcelo traça a dublê de mãe (na cabeça do menino) que é Mylla Christie. Se da pedra temos apenas uma vaga idéia é porque Khouri só é capaz de ver nela um símbolo materno. Mas seria estúpido pedir para Khouri ser Burroughs. Se para esse uma pedra nem sempre é uma pedra, Para WHK a pedra é simplesmente o cineminha recalcado de um menino que vê a perda do sublime. E nós vemos Paixão Perdida.

Ruy Gardnier