O Grande Lebowski (The Big Lebowski),
de Joel Coen (EUA, 1997)

Com O Grande Lebowski, os irmãos Coen parecem ter chegado a algum lugar, algum rincão de suas carreiras que é algo como um limite para as pesquisas estéticas desenvolvidas até então. Jamais outro filme deles trabalhou tanto o imediato, a descontinuidade, o escárnio pelo escárnio dos mais diversos tipos da sociedade americana. Tudo que permanecia em estado de amálgama em seus filmes precedentes — Fargo e Na Roda da Fortuna — é levado à última potência nesse filme.

O filme é centrado em Jeff Lebowski, o Dude, um sujeito que ama o sossego, a tranqüilidade, um bom baseado e o boliche. Por um propósito qualquer, ele é confundido com um milionário que tem o mesmo nome que ele. Todos os personagens que passam pelos dois Lebowski são, de alguma forma, praticantes da bobagem: os seguranças entram na casa do sujeito errado, a lourinha não sabe controlar seus gastos, o secretário do chefão é um grande baba-ovo, os parceiros de boliche são enrolados e vivem arrumando encrenca. Aliás, os próprios homônimos não passam de dois zeros à esquerda, um amável – o riponga sujismundo interpretado por Jeff Bridges — e o outro detestável.

A figura do filme é certamente o deboche. Sem dar muita atenção especial ao desenrolar da história, O Grande Lebowski aparece mais como exercício de escárnio indiferenciado contra todos os segmentos da sociedade americana — os artistas plásticos de vanguarda, os policiais, a família de classe média... Todos os personagens em frente à câmara de O Grande Lebowski agem apenas pela besteira e nada mais: John Goodman se jogando do carro para salvar a pasta com dinheiro, Steve Buscemi sempre fazendo comentários idiotas, John Turturro e seus gestos afeminados de um personagem chamado "Jesus". Mas antes de combater a besteira com a besteira — como fazem os irmãos Farrelly em Quem Vai Ficar com Mary? —, Ethan e Joel Coen não conseguem em nenhum momento abdicar de seus profundos conhecimentos na arte de fazer cinema "de arte". Resulta que O Grande Lebowski é um filme preconceituoso, pedante, de um cinismo niilista, que ri da cara de todo mundo menos da sua própria. A recusa em fazer autoparódia compromete o filme inteiro.

Se nos filmes precedentes a imbecilidade era de certa forma explicada — pelos constrangimentos geográficos, sociais, etc. —, em O Grande Lebowski ela é considerada enquanto estado mental normal de qualquer um. O engraçado é que o filme não é feito dessa forma; ao contrário, é de uma estilização jamais encontrada em qualquer outro filme dos irmãos Coen. Na cena mais interessante de O Grande Lebowski, o Dude e seu companheiro Walter (interpretado por John Goodman) vão despejar no Oceano os restos mortais de seu companheiro de boliche. Quando o recipiente é aberto, o vento leva o pó todo na direção contrária, que é o rosto do Dude. A cena serve de termo geral para o filme, mas não parece que os irmãos queiram jogar a menor poeira um no outro. Suas tarefas de cineastas permanecem intocadas, vendo o mundo se acabar do alto de uma torre de marfim. O filme acaba com a confirmação de mais um Dude no mundo, como se o deixadissismo, uma malandragem blasé fosse a única resposta a um mundo complexo demais para ser recriado através da ficção. É uma pena, porque em vários filmes deles próprios ainda havia um princípio de explicação (Barton Fink, Fargo). Em O Grande Lebowski, os irmãos Coen estão formalmente mais para o grande Lebowski (o milionário paraplégico) do que para o riponga Dude. Esperemos, então, o próximo Coen-film.

Ruy Gardnier